A primeira grande vantagem do regime monárquico sobre o republicano é assegurar a unidade nacional. A monarquia garante de modo excelente a unidade nacional — bem de suprema importância, como ensina São Tomás de Aquino na sua obra “O Governo dos Príncipes”— não apenas no plano teórico, mas também na prática. A república, pelo contrário, não é capaz de assegurar convenientemente essa unidade.
Quando um príncipe herdeiro sucede a seu pai e sobe ao trono, sabe que pode contar, a priori, com a expectativa benévola e unânime do povo. Todos “torcem” para seu reinado ser bem
sucedido; ele praticamente não tem adversários e opositores.
Essa é uma vantagem imensa, de grande alcance para o pleno êxito de suas funções. Quem já sobe assim amparado pelo desejo de colaboração de todos, pode melhor do que ninguém assegurar a unidade nacional.
Um presidente da república não tem meios de assegurar da mesma forma essa unidade porque ele sempre representa uma parcela da nação, uma vez que a própria eleição limita e restringe sua representatividade. O pressuposto da eleição republicana é sempre a disputa, a luta entre partidos e facções. Nunca um presidente sobe com o país inteiramente contente.
Quando alguém se elege presidente, só ficam alegres ele próprio, sua família, seus amigos e aqueles que votaram nele. Todo o resto da nação, ou seja, os candidatos derrotados, as respectivas famílias, as rodas de seus amigos, os que votaram neles, os que votaram em branco, os que anularam seu voto, os que abstiveram de votar, ou os que simplesmente não estavam capacitados a votar – todos esses não têm motivos para ficar contentes. Às vezes, têm até motivos para desejar que o presidente eleito fracasse...
No sistema de eleições republicanas, as minorias vencidas — que, unidas, frequentemente somam mais votos do que o candidato vencedor — são obrigadas a suportar contra a própria vontade aquele candidato que rejeitaram.
Aliás, diga-se de passagem, é muito questionável, do ponto de vista democrático-representativo, a legitimidade de um candidato eleito por maioria simples, ou seja, quando a votação que obteve foi inferior ao total dos votos obtidos pelos outros candidatos, somados aos votos em branco e nulos. Pois isso significa que a maioria do eleitorado o rejeitou, e apenas uma minoria o sufragou. Sem dúvida, se esse mesmo candidato obtém no segundo turno maioria absoluta, essa pecha de ilegitimidade até certo ponto se atenua. Mas não se desfaz de todo, uma vez que muitos dos votos do segundo turno lhe foram dados apenas à falta de melhor. E é quase sempre uma minoria bastante considerável que, mesmo no segundo turno, o rejeita.
Uma vez eleito, o presidente procura conciliar as simpatias de todos fazendo questão de estender a mão para os adversários, pedir-lhes a colaboração para o bem da pátria etc. Discursos desses são de praxe no começo de cada governo.
Alguns presidentes vão mais longe. Até rompem — ou fingem romper — com pessoas que lhes deram apoio, e oferecem cargos de confiança a adversários dispostos a colaborar. Com isso tentam disfarçar a pouca autenticidade da apregoada imparcialidade, e conseguem por vezes livrar-se de aliados incômodos, garantindo um tal ou qual apoio entre os adversários menos enragés. Sem embargo disso, também essas atitudes não convencem muito. Quando o presidente foi eleito por pequena margem de votos, elas são vistas habitualmente como sinal de fraqueza política. E só servem para assanhar as oposições.
Quando a vitória foi mais cômoda e a posição do presidente é mais segura, ainda assim tais atitudes não são tomadas muito a sério, nem pelos amigos nem pelos inimigos do novo chefe de Estado.
Em qualquer dos casos, precisamente porque sabe que não pode contar com todos os seus compatriotas, o presidente eleito tem a natural tendência de procurar se assegurar do apoio dos que o sustentaram na campanha eleitoral.
Como? Evidentemente, favorecendo-os.
De um lado, o presidente dependeu, para subir, de um partido, e sua força lhe veio exclusivamente desse partido; mas, de outro lado, o próprio partido que elegeu o presidente espera ser por este reforçado após a eleição; e nesse sentido é do presidente que o partido tira sua força. É uma curiosa reversibilidade... para não falar de círculo vicioso.
Em consequência desse defeito de origem, o presidente, ao contrário do monarca, nunca tem as mesmas condições de independência para exercer suas funções.
Um príncipe não é candidato a nada. É unicamente de Deus e da História que lhe vem sua posição. Por isso, sobe ao trono sem depender de ninguém, e é como independente que estará ao serviço da nação inteira. Por isso, ainda, um monarca pode agir com vistas no futuro remoto e pode desenvolver planos de longo alcance, sem temer, como habitualmente temem os presidentes, os sobe-e-desce da popularidade imediatista.
Uma eleição presidencial custa, atualmente, muitos milhões de dólares em qualquer parte do mundo. A serem exatos os cálculos de especialistas em marketing político divulgados pela imprensa, os gastos da campanha de um candidato que deseje concorrer seriamente à presidência da República brasileira podem chegar à casa dos 500 milhões de dólares – quantia espantosa que corresponde a mais de 3 mil anos de salário de um presidente!
Para custear as campanhas, os candidatos recorrem a contribuições de seus correligionários. Evidentemente, quem apóia um candidato de alguma forma espera algum retorno.Depois de eleito, o presidente não pode olhar para todos do mesmo modo. Há pessoas a quem deve favores imensos e há adversários que fizeram tudo para que ele não fosse eleito, e que ele sabe farão tudo para atrapalhar o seu governo. Entre uns e outros precisa equilibrar-se o presidente. Dos primeiros depende, porque carece do seu apoio; dos segundos também depende, porque teme sua oposição. O regime republicano tem, pois, necessariamente, chefes de Estado dependentes.
Ora, a independência é fundamental para que o governante possa desempenhar as suas funções com isenção e com desembaraço, para consertar certos abusos e, doa a quem doer, tomar as medidas realmente necessárias para o país. Como fará isso com total liberdade se de alguma forma é dependente?Outro efeito da independência do monarca é que ele não precisa estar a todo momento pautando sua ação pelos índices da popularidade passageira e pode, por isso, fazer planos de longo prazo. Em consequência dessa visão mais abrangente a longo prazo, também a prazo imediato as soluções para os problemas concretos são mais acertadas.
O monarca, por outro lado, já nasce príncipe, já nasce nos degraus do trono, sabe que depois dele reinará seu filho, ou seu neto, ou o parente que estiver mais próximo da linha de sucessão. Sabe perfeitamente que será julgado pela História, e não pelos movimentos passageiros de opinião pública. Por isso, ele muitas vezes tem a coragem de tomar medidas impopulares que normalmente falta ao político eleito; e seu interesse está em realizar obras de longo prazo que o político – cuja atenção não pode deixar de estar voltada muito preponderantemente para as incertezas da próxima eleição – habitualmente não é levado a considerar.
São tão numerosos os exemplos na História de monarcas com visão de longo prazo, que até é difícil a escolha. Tomemos um, entre mil outros:
Dom Diniz, Rei de Portugal de 1279 a 1325 e esposo de Santa Isabel – a célebre Rainha Santa – passou para a posteridade com o cognome de o Rei Lavrador.
Isso porque em seu reinado procurou incentivar o cultivo e o aproveitamento das terras – então muito vastas para a pequenina população de Portugal – que seus antecessores haviam conquistado aos mouros. Numa perspectiva imediatista, Dom Diniz fez uma coisa que talvez não parecesse razoável, e que somente com uma visão de longo alcance se podia compreender: ele mandou plantar, na região de Leiria, extensos pinheirais.
Por que o fez? Segundo antiga e muito respeitável tradição corrente em Portugal, Dom Diniz previa que seu povo se multiplicaria cada vez mais, e que tempos viriam em que o território disponível no continente europeu já não seria suficiente para abrigar toda a grei portuguesa, a qual precisaria penetrar mar adentro à procura de novas terras e novos horizontes. Nessa ocasião, haveria necessidade de madeira, de muita madeira, para construir os navios que desbravariam os mares. Os pinheirais do previdente rei forneceriam então essa madeira.
Porventura algum presidente de república se empenharia tanto fazendo despesas cujos frutos só iriam aparecer no mandato de um remoto sucessor, sem nenhuma vinculação de sangue ou de interesse com ele? Claro que não.
Como observou o pensador espanhol Eugenio Vegas Latapié, é próprio dos reis plantarem bosques para o futuro; e é próprio das repúblicas os abaterem na primeira necessidade de lenha que se lhes apresente.
Justamente porque contam com o tempo e com o importantíssimo fator da continuidade, os reis procuram naturalmente soluções verdadeiras que muitas vezes só revelarão seus frutos a longo prazo. E não cedem à tentação do êxito fácil, vistoso e superficial, do qual dependem os favores imediatistas do eleitorado.
O artigo a seguir foi escrito por Armando Alexandre dos Santos, e publicado no boletim “Herdeiros do Porvir”, do Pró Monarquia, secretariado da Casa Imperial do Brasil.