[Trazemos a entrevista que S.A.I.R. o Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, Chefe da Casa Imperial do Brasil de 1921 a 1981, concedeu à edição de 6 de dezembro de 1962 do periódico monarquista “O Debate”, de Lisboa, em Portugal. A fotografia que acompanha a publicação é do acervo do Prof. Rafael Cruz, monarquista do Estado da Bahia.]
Marcus de Noronha da Costa
Quando da minha recente viagem ao Brasil, tive a honra de conhecer em São Paulo e tomar contato com S.A.I.R. o Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, Pretendente ao Trono do Império do Brasil.
Figura bem representativa do Ramo Bragança Brasileiro, de olhar franco, sempre disposto a esclarecer todos aqueles que se lhe dirigem com perguntas, principalmente quando estas são para ficarem arquivadas num jornal monárquico.
S.A.I.R. D. Pedro Henrique de Orleans e Bragança é o filho mais velho do saudoso Príncipe Imperial D. Luiz de Orleans e Bragança e da Princesa D. Maria Pia de Bourbon-Duas Sicílias. D. Luiz tornou-se Príncipe Imperial e herdeiro imediato da Coroa com a renúncia ao trono, em 30 de Outubro de 1908, do então Príncipe herdeiro D. Pedro de Alcântara de Orleans e Bragança, salientando-se desta:
“Declaro, pois, que por minha muito livre e espontânea vontade dele desisto pelo presente e renuncio, não só por mim, como por todos e cada um dos meus descendentes, a todo e qualquer direito que a dita Constituição nos confere à Coroa e Trono Brasileiros, o qual passará às linhas que se seguirem à minha conforme a ordem de sucessão estabelecida pelo Art. 117. Perante Deus prometo por mim e meus descendentes manter a presente declaração. Cannes, 30 de Outubro de 1908.”
Esta renúncia foi conseqüência do casamento morganático que tinha contratado e realizou.
Sucedeu-lhe nos direitos o seu Irmão, o Príncipe Imperial D. Luiz de Orleans e Bragança (...).
Foi numa tarde quente de Agosto, em casa do meu prezado amigo, o Prof. Doutor Sebastião Pagano, que me foi dado entrevista S.A.I.R. o Príncipe D. Pedro Henrique de Orleans e Bragança.
As perguntas foram entregues para a mão do Príncipe que, depois de as ler, me começou a responder pausadamente:
1. Quando voltou V. Alteza ao Brasil?
– Vim pela primeira vez ao Brasil nas comemorações do 1º Centenário da Independência, em fins de Agosto de 1922, como representante direto de meu trisavô e meu bisavô, respectivamente D. Pedro I e D. Pedro II, visto que me foi dirigido o convite como Chefe da Casa Imperial do Brasil. Terminadas as comemorações, regressei à Europa, tendo-me casado a 19 de Agosto de 1937, em Munique, com a Princesa Maria de Wittelsbach, da Casa Real da Baviera. Deu-nos Deus doze filhos; estes são o Príncipe Imperial D. Luiz, que está no 3º ano de Química na Universidade de Munique; D. Eudes, guarda-marinha da Marinha de Guerra Brasileira, que na festa do Duque de Caxias recebeu o seu espadim; D. Bertrand, aluno do 2º ano da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, fundada por meu trisavô, o Imperador D. Pedro I; D. Isabel, estudando o Clássico no Colégio das Irmãs do Sacré-Coeur, no Rio de Janeiro; D. Pedro e D. Fernando, alunos internos do Colégio dos Maristas, no Maranhão; e o resto em casa. Estes últimos são: D. Antonio, D. Eleonora, D. Francisco, D. Alberto e os mais novos, as gêmeas D. Maria Thereza e D. Maria Gabriela.
2. Quando V. Alteza voltou de novo para o Brasil, onde se fixou?
– Fixei-me no Estado do Paraná, onde adquiri uma fazenda, em 1951, junto da cidade de Jacarezinho, onde o Duque de Ancona e o Príncipe Gabriel de Bourbon têm as suas fazendas. Ali eu tenho uma larga produção de gado vacum com alguns bons produtores, bem como cultivo de larga escala de café, tabaco, arroz e milho, estando este último cereal provando muito bem. Com o crescimento dos filhos, tenciono adquirir uma fazenda próxima de São Paulo, para poder estar mais perto das pessoas que me rodeiam, como meu incansável colaborador Prof. Sebastião Pagano.
3. Quando foi a última vez que V. Alteza esteve em Portugal?
– A última vez que estive em Portugal foi em 1948. Guardo as melhores recordações da minha visita, sobretudo da maneira tão hospitaleira como fui recebido pelas famílias portuguesas, e também pelas recordações que Portugal teve para a Família Imperial, especialmente de conservarem no Pantheon de São Vicente os restos mortais do Fundador do Império e de este ter servido de guarida temporária aos meus bisavós, a Imperatriz D. Teresa Cristina e o Imperador D. Pedro II, depois de um exílio tão amargurado, antes de seus restos mortais serem depositados na Catedral de Petrópolis.
4. Que pensa V. Alteza da política ultramarina portuguesa?
– Tenho acompanhado com o maior interesse o desenvolvimento do Ultramar Português, porque a ele me sinto preso pelos laços de sangue que me ligam aos Reis de Portugal, meus Maiores. É difícil compreender as posições que os países da América tomam perante o “fenômeno colonialista”; estes países, na sua grande maioria, foram colônias, não considerando neste caso o Brasil, que sempre teve posição singular.
Os países americanos sentem-se intimamente ligados aos novos Estados que surgiram do colonialismo, mas, no caso de Portugal, temos de considerar que Portugal nunca teve colônias no sentido jurídico da palavra, porque, desde sempre, os indígenas gozaram de prerrogativas e assimilaram-se facilmente. Só um país como Portugal pode, hoje em dia, desempenhar uma missão colonizadora, porque esta missão foi sempre a de Portugal, na Índia como no Brasil, e, atualmente, na África Portuguesa.
Por outro lado, não podemos dar crédito aos organismos internacionais, tais como a ONU, porque neles dominam o ódio e a injustiça, em vez da verdade e da justiça. A ONU, hoje em dia, é, infelizmente, mais do que tudo, um ponto de desunião do que um Areópago da Paz. Assim, todas as resoluções tomadas por esta organização de política internacional possuem, em qualquer caso, e neste especialmente, que se refere a Portugal, um partidarismo exclusivista de países que querem conquistar a todo o custo mercados internacionais.
5. Que pensa V. Alteza da atualidade da Instituição Monárquica?
– Desde sempre tenho acompanhado atentamente a evolução das doutrinas monárquicas; cada país deve reger-se pelas suas leis próprias e evoluí-las conforme as exigências dos tempos. Se a Monarquia não pertencesse à atualidade, eu não ouvia falar tanto da sua necessidade. Vemos como a doutrina monárquica tem sido aceita nas camadas juvenis de hoje e o interesse que nela depositam os Príncipes europeus.
A melhor prova da contemporaneidade da Instituição Real, mostrou-nos recentemente o Arquiduque Oto de Habsburgo, no seu recente ensaio, “A Monarquia na Era Atômica”, onde, com rara clarividência, demonstra a atualidade da ideia monárquica frente aos acontecimentos que o mundo hoje está atravessando.
6. Tem a tradição algum valor para a doutrina monárquica?
– Sem dúvida, mas não nos devemos prender exclusivamente ao que fizeram os nossos antepassados, mas em mostrar também as nossas possibilidades reais, sem estarmos constantemente a recorrer ao passado. Devemos partir do princípio de que temos de escrever para os homens de hoje, interessando a estes as realidades do momento presente; por isso, a tradição deve servir apenas de complemento à doutrina exposta. Se muitas vezes nos chamam de retrógados, é por estarmos, no campo doutrinário, limitados e agarrados ao passado; temos de saber usar da tradição e das lições do passado com a devida ponderação.
7. Qual o caminho a seguir no pensamento de V. Alteza quanto à Monarquia no momento atual?
– Não nos podemos desprender da sociedade em que vivemos, porque fazemos parte dela integralmente. Quanto mais responsabilidades possuímos, maior é o nosso elo de ligação com a sociedade. No meu ponto de vista, observo dois problemas fundamentais; a questão social e o perigo comunista.
A questão social, desde longa data, tem sido tratada tanto pelos Papas, como pelos doutrinadores monarquistas, não devendo esquecer-se os nomes de La Tour du Pin e de Charles Mauras. Recentemente, o Papa João XXIII, na sua extraordinária encíclica “Mater et Magistra”, chama a atenção dos governantes do mundo para este problema.
Cabem aos monarquistas realizarem em seus planos e estudos doutrinários a solução da “questão social”; realizado este trabalho, terão dado a melhor prova da eficácia da ideia monárquica. Temos, agora, a considerar o perigo comunista. Karl Marx e Engels, na sua obra, realizaram a criação de uma nova ordem social, que foi forçada a aceitar em muitos países do mundo, mas, observando os resultados, estes foram escassos, e toda a obra realizada tem sido feita sobre trabalho forçado e constante vigilância armada.
A propaganda comunista nos países livres é muito bem dirigida, sugestionando as camadas superiores da sociedade. Um verdadeiro nacionalismo só se pode realizar dentro de uma Monarquia, sendo esta a única forma de se opor ao avanço comunista. Mas esta Monarquia tem de ser eminentemente social, por que o Rei deve andar sempre perto do Povo, para que se realize a verdadeira justiça social, há muito ambicionada por todos os homens de bem.
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Registramos com o maior prazer estas palavras de S.A.I.R. o Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, conhecedor atento dos problemas atuais. As declarações de S.A.I.R. vêm uma vez mais confirmar os seus estudos, que levou a cabo na Sorbonne, em Paris, na Escola de Altos Estudos Políticos e Sociais.
Resta-nos, ao terminar, agradecer ao Chefe da Família Imperial do Brasil a entrevista com a qual quis tão amavelmente honrar as colunas de “O Debate”.
Foto: em reportagem de 1966, SS.AA.II.RR. o Príncipe Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, Chefe da Casa Imperial do Brasil de 1921 a 1981, e sua esposa, a Princesa Consorte e Princesa Mãe do Brasil, Dona Maria da Baviera de Orleans e Bragança, com seus oito filhos mais novos, SS.AA.RR. os Príncipes Dom Pedro de Alcantara, Dom Fernando, Dom Antonio, Dom Francisco e Dom Alberto e as Princesas Dona Eleonora, Dona Maria Thereza e Dona Maria Gabriela de Orleans e Bragança.