segunda-feira, 31 de julho de 2017

O que Charles Darwin viu no Brasil

Foi na Bahia e no Rio que o naturalista se deparou pela primeira vez com a diversidade da floresta tropical e também se chocou com a escravidão: pontos tidos como cruciais para a elaboração de sua revolucionária teoria.

Sklaven in Brasilien (Getty Images/Florilegius)
Escravos no Brasil, em pintura de 1835: Darwin cita muitas vezes exemplos claros de crueldade contra negros

A passagem Charles Darwin (1809-1882) pelo Brasil pode ter sido muito mais importante para a Teoria da Evolução das Espécies do que se costuma imaginar. Muito se fala sobre as observações feitas pelo naturalista britânico nas Ilhas Galápagos e na Patagônia argentina. Mas foi em solo brasileiro, há 185 anos, que ele se deparou pela primeira vez com a diversidade da floresta tropical e também se chocou com a escravidão – reforçando suas convicções abolicionistas de que todos os seres humanos compartilham a mesma linhagem sanguínea em razão da ancestralidade comum.

Os dois pontos, segundo especialistas, foram cruciais para a elaboração da revolucionária teoria que separou, pela primeira vez, a ciência da religião, lançada, em 1859, no livro A origem das espécies. Segundo a Teoria da Evolução, todas as espécies evoluem a partir de mutações aleatórias e da seleção natural dos mais bem adaptados. E o homem é ligado a todos os outros animais por descender de um ancestral comum ao dos macacos e, por isso, não poderia haver diferenciação entre raças.
O HMS Beagle, comandado pelo capitão Fitz-Roy, partiu de Davenport, na Inglaterra, em 27 de dezembro de 1831, para uma viagem ao redor do mundo que duraria cerca de cinco anos. 

A bordo estava o jovem naturalista Charles Darwin, de apenas 22 anos. Depois de passar por Cabo Verde, o navio seguiu para o arquipélago brasileiro de São Pedro e São Paulo e para Fernando de Noronha, antes de parar na Bahia. No livro Viagens de um naturalista ao redor do mundo, Darwin dedica cerca de dez páginas a sua passagem por Salvador, aonde chegou em 29 de fevereiro de 1832.
Embora a estadia na capital baiana tenha sido curta, Darwin passeou pela cidade e chegou mesmo a explorar um pouco do interior, coletando amostras de plantas, insetos e até um lagarto. Num dos trechos de seu diário, ele nota que coletou uma grande quantidade de flores tão brilhantes e coloridas, que seriam capazes de fazer um "florista enlouquecer”. Ainda na cidade, Darwin enfrentou pelo menos duas experiências que considerou assustadoras: uma forte tempestade tropical e o carnaval de rua de Salvador – em que foi acertado pelas bolas de cera recheadas de água, o chamado limão de cheiro, usado na época nos festejos.

Em suas anotações ele ressalta que todo o trabalho braçal era feito por negros, registra relatos de escravos e se refere aos ingleses preconceituosos como "selvagens polidos”.

"De onde vem a diversidade?"

Em 4 de abril, o navio chegou ao Rio de Janeiro, onde o naturalista ficaria por mais de quatro meses. Um capítulo inteiro de seu livro é dedicado a este período em que fez uma longa incursão pelo interior do estado, coletando dados geológicos, amostras de plantas e animais e, como sempre, histórias do horror da escravidão.

 "O impacto da passagem de Darwin pelo Brasil não foi pequeno e motivou a pergunta ‘de onde vem a diversidade?'”, afirma o presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ildeu Moreira, que está terminando de organizar um livro reunindo todos os escritos de Darwin sobre o Brasil, entre relatos de viagens e cartas. "Em vários trechos ele diz que uma das coisas que mais o impressionaram foi a diversidade da natureza tropical que viu em Salvador e no Rio.”

Charles Darwin Portrait (Hulton Archive/Getty Images)
Charles Darwin, retrato de 1880: passagem pelo Brasil motivou a pergunta ‘de onde vem a diversidade?'"

Charles Darwin vinha de uma família liberal e antiescravagista, mas nunca tinha visto a escravidão de perto. A ideia de que a postura antiescravagista de Darwin estaria na origem da Teoria da Evolução é defendida por dois grandes especialistas na obra de Darwin e biógrafos do naturalista, Adrian Desmond e James Moore, no livro A causa sagrada de Darwin.

 "Vivenciar a escravidão desta forma e constatar a diferenciação absurda feita entre seres humanos certamente o impactou bastante”, sustenta Moreira. "Ele cita muitas vezes exemplos claros de crueldade contra escravos e dá para notar claramente a irritação dele ao discutir a escravidão com Fritz-Roy.”

Poucos dias depois da chegada de Darwin ao Rio, o naturalista escreve que conheceu um inglês que se preparava para visitar suas propriedades, "situadas a pouco mais de 100 milhas (160 km) da capital", ao norte de Cabo Frio. "Ele teve a gentileza de me convidar como companhia, o que aceitei com prazer”. A expedição começou no dia 8 de abril. Darwin conta que, em meio a um calor intenso, o silêncio da mata era completo, "quebrado apenas pelo voo preguiçoso das borboletas”.
Já neste primeiro dia, o grupo passou por uma fazenda na Lagoa de Maricá. Lá ele ouviu uma história que reproduz em seus escritos.

Um grupo de capatazes teria sido enviado em busca dos escravos fugitivos e todos eles acabaram se rendendo, encurralados junto a um precipício, à exceção de uma mulher, já de uma certa idade, que preferiu se lançar para a morte. "Praticado por uma matrona romana, esse ato seria interpretado e difundido como amor à liberdade”, escreveu Darwin. "Mas da parte de uma pobre negra, se limitaram a dizer que não passou de um gesto bruto."

"Jamais voltaria"

Outra história chamou muito a atenção de Darwin, desta vez numa fazenda em Conceição do Macabu, no interior do estado.

"Ele fica particularmente chocado ao ver um capataz ameaçar separar uma família como forma de punição”, conta Kátia Leite Mansur, do Departamento de Geologia da UFRJ, uma das idealizadoras do projeto Caminhos de Darwin, que mapeou toda a região por onde o naturalista passou em sua expedição. "Ele escreve que além do uso da força, é um dos castigos mais cruéis. E diz que jamais voltaria a um país em que houvesse escravidão.”

Em 2009, por conta dos 200 anos do nascimento do naturalista, 12 placas foram instaladas ao longo do percurso com informações sobre a sua passagem. Ainda em 2017, Kátia espera inaugurar seis grandes painéis com informações geológicas. Há ainda o projeto de se construir um espaço Darwin na Fazenda Campos Novos, entre Cabo Frio e Búzios, um dos pontos de pouso do naturalista. A fazenda, do século 18, é tombada pelo patrimônio, mas precisa de reformas. Trata-se da mais antiga fazenda jesuíta que resta em pé no país.

"Darwin ficou muito tempo no Rio, onde fez observações sociais, levantou questões relativas à escravidão, e ainda coletou muita coisa, descreveu muitas plantas, bichos e rochas”, resume Katia. "O tempo que passou no interior viu coisas que nunca tinha visto, restingas, borboletas. Também descreve os lugares por onde passa, as hospedarias, igrejas, as comidas, as pessoas. E é um relato muito poético, muito bonito.”

A viagem do Beagle estava prevista para durar apenas dois anos, mas acabou se prolongando por quase cinco, com uma volta ao mundo, que incluiu as passagens mais conhecidas da expedição do naturalista pelas Ilhas Galápagos e a Patagônia. Quando finalmente voltou à Inglaterra, Darwin já era famoso por conta das amostras que mandava regularmente a seu país.

Ao que tudo indica, não foi apenas a visão dos tentilhões e dos fósseis de mamíferos gigantes que forjaram a mais revolucionária das teorias científicas, mas também a exuberância da floresta tropical brasileira e os horrores da escravidão.

LINK ORIGINAL - Deutsche Welle

quinta-feira, 27 de julho de 2017

EPITACIO PESSÔA - O OUTRO LADO DO GOVERNO


Hoje damos continuidade à série de publicações, iniciada no dia 15 de novembro último, o 125º aniversário do Golpe da Proclamação da República, sobre os homens e a mulher que vêm ocupando a Presidência da espúria República Brasileira, sempre contribuindo para a calamitosa crise política e moral na qual nosso País hoje se encontra.

Prosseguindo com a série, falaremos hoje sobre o 11º Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil:

Epitacio Lindolpho da Silva Pessôa nasceu em Umbuzeiro, Província da Paraíba, no dia 23 de maio de 1865, neto de um dos revoltosos da Revolução Praieira (1848-1850). Órfão aos sete anos de idade, quando seus pais foram mortos em uma epidemia de varíola, ele foi criado por seu tio e então Governador da Província de Pernambuco, Henrique Pereira de Lucena, Barão de Lucena (1835-1913), título que lhe dado pela então Regente do Império, a Princesa Dona Isabel (1846-1921), a Redentora, por sua contribuição na aprovação da Lei Áurea, em 1888.

Pessôa foi casado duas vezes: a primeira, em 1894, com Dona Francisca Justiniana das Chagas da Silva Pessôa (1872-1895), que veio a falecer durante o parto de seu primeiro filho, um natimorto; a segunda vez, em 1898, com Dona Maria da Conceição de Manso Sayão da Silva Pessoa (1878-1958), que lhe deu três filhos e era oriunda da elite agrária de Vassouras (RJ).

Após se formar pela Faculdade de Direito de Recife, Epitacio Pessôa seguiu para o Rio de Janeiro, onde passou a lecionar. Filiado ao Partido Republicano, pós o Golpe da Proclamação da República, em 15 de novembro de 1889, ele foi nomeado Secretário-Geral do primeiro Governo republicano da Paraíba. Em seguida, integrou a Assembleia Nacional Constituinte de 1891 e seguiu como membro da Câmara dos Deputados. No entanto, devido a desavenças com o então Presidente da República, o assassino Marechal Floriano Peixoto (1839-1895), Pessôa foi residir na Europa (afinal, Floriano era conhecido por mandar matar seus desafetos).

Retornando ao Brasil, Epitacio Pessôa foi Ministro das Finanças entre 1898 e 1901, no desastroso Governo do Presidente Campos Salles (1841-1913). Agora, se houve justiça naquele Governo é bastante discutível, já que o poder das oligarquias foi aumentado ainda mais, para não falar no crescimento absurdo dos impostos. Em 1912, Pessôa foi eleito Senador pelo Estado da Paraíba, mas abandonou o cargo dois anos depois para ir viver na Europa.

Em 1919, ele substituiu Ruy Barbosa (1849-1923) – o mesmo que, já na República, mandou queimar os registros de todos os escravos brasileiros, para evitar o pagamento de subsídios do Governo aos ex-cativos, e causou a Crise do Encilhamento (1891) – como Chefe da Delegação Brasileira na Conferência de Paz de Versalhes, após o término da Primeira Guerra Mundial (1914-18).

Tendo retornado ao Brasil, Epitacio Pessôa foi escolhido pelas oligarquias que dominavam o cenário político da República Velha para se eleito Presidente do Brasil. Ele tomou posse no dia 28 de julho de 1919, pois o Presidente eleito em 1918, Rodrigues Alves (1848-1919) – que já havia sido Presidente da República entre 1902 e 1906, tendo sido responsável pelo surgimento e proliferação das favelas – morreu da epidemia de gripe espanhola e a Constituição de 1891 estimulava que caso o Presidente morresse antes de completar dois anos de mandato, o Vice-Presidente – então bastante inapto Delfim Moreira (1868-1920) – governaria apenas caráter provisório, até que fossem realizadas novas eleições.

Não tardou para que o novo Governo se mostrasse mais do mesmo na República Brasileiro: sucederam-se inúmeras greves; o Presidente, um líder fraco, sempre sedia à pressão dos empresários e dos cafeicultores; a dívida externa do Brasil cresceu ainda mais; o Governo Federal não parava de intervir nos Estado, fazendo valer a vontade das oligarquias. Tudo isto culminou na eclosão da Revolta do Forte de Copacabana, em 1922, quando catorze pessoas foram executadas por ousarem exigir o fim dos desmandos oligárquicos. Autoritário, Epitacio Pessôa fez o possível para perseguir seus opositores políticos. Seu Governo ainda foi marcado pela Semana de Arte Moderna, onde as atrocidades apelidadas de obras de arte serviam apenas para refletir a decadência e a feiúra da República.

O Presidente também não fez o mínimo esforço para esconder o que havia no DNA da República Brasileira – filha bastarda de mãe escravocrata e pai ditador –, quando vetou, no ano de 1921, a participação de jogadores negros na Seleção Brasileira de Futebol, que iria disputar o Campeonato Sul-Americano daquele ano.

Ironicamente, algumas das pouquíssimas ações positivas da Presidência de Epitacio Pessôa são diretamente relacionadas ao regime monárquico: a primeira, no dia 3 de setembro de 1920, ele revogou a criminosa Lei do Banimento, que impedia a Família Imperial de entrar em território brasileiro. Isto foi feito apenas após o falecimento do herdeiro da Redentora, o Príncipe Imperial Dom Luiz (1878-1920), que era muito temido pelas autoridades republicanas.
A segunda, ainda em 1920, quando recebeu a visita oficial do Rei Albert I dos Belgas (1875-1934) e de sua augusta esposa, a Rainha Elisabeth (1876-1965), nascida Duquesa na Baviera. Foi a primeira visita de uma Chefe de Estado estrangeiro ao Brasil.

Por fim, em 1922, o Presidente da República enviou um convite formal ao Príncipe Dom Pedro Henrique (1909-1981), então Chefe da Casa Imperial do Brasil, para que Sua Alteza Imperial e Real e demais membros da Família Imperial viessem ao Brasil para participar das celebrações pelo Centenário da Independência, proclamada por nosso Imperador Dom Pedro I (1798-1834). O convite foi aceito, para o júbilo de grande parte dos brasileiros, que iriam ser apresentados àquele que seria seu Imperador; no entanto, a visita foi marcado pelo luto nacional pelo passamento do Príncipe Dom Gaston, Conde d’Eu (1842-1922), que falece durante a travessia do Atlântico.

Tendo fracasso em eleger seu sucessor, no final de 1922, Epitacio Pessôa foi nomeado Ministro da Corte Permanente de Justiça Internacional de Haia – parece-nos que ser autoritário e racista fossem pré-requisitos necessários para nomeação –, permanecendo no cargo até 1930. No período de 1924 e 1930, ele também atuou como Senador pela Paraíba, apoiando, em seu último ano de mandato, o Golpe de Estado que elevou Getulio Vargas (1882-1954) à Presidência da República, instaurando uma ditadura fascista no Brasil. É notável que Pessôa nunca fez esforço para esconder sua paixão pelo autoritarismo.

O ex-Presidente da República morreu no dia 13 de fevereiro de 1942, aos setenta e seis anos de idade e sofrendo de Mal de Parkinson e problemas cardíacos, em seu Sítio Nova Betânia, próximo à Imperial Cidade de Petrópolis (RJ).

TEXTO - CAUSA IMPERIAL

FONTES BIBLIOGRÁFICAS:
• ‘Epitácio Pessoa e o Juízo de Seus Contemporâneos’, Ed. Patria Degli Italiani, Rio de Janeiro, 1925.
• ‘Perfis Parlamentares 07 – Epitácio Pessoa’, Ed. Câmara dos Deputados, 1978.
• ‘Bacharel Epitácio Pessoa e o Glorioso Levante Militar de 5 de Julho’, 1922.
• ‘1º Centenário do Nascimento de Epitácio Pessoa’, Ed. A União, 1965.
• GABAGLIA, Laurita Pessoa Raja, ‘Epitácio Pessoa – 1865-1942’, Ed. José Olympio, 1951.
• KOIFMAN, Fábio, Org. ‘Presidentes do Brasil’, Ed. Rio, 2001.
• PESSA, Epitácio, ‘Obras Completas’, Ed. Instituto Nacional do Livro, 1955.
• ÍDEM, ‘Pela Verdade’, Ed. Livraria Francisco Alves, 1925.
• PESSOA, Mário, ‘Legalismo e Coragem em Epitácio Pessoa’, Ed. Imprensa Universitária, 1965.
• MELO, Fernando, ‘Epitacio Pessoa – Uma Biografia’, Ed. Idéia, 2005.
• SILVA, Hélio, ‘Epitácio Pessoa – 11º Presidente do Brasil’, Ed. Três, 1984.
• VALADÃO, Haroldo, ‘Epitácio Pessoa – Jurista da Codificação Americana do Direito Internacional’, Rio de Janeiro, 1977.
• ZENAIDE, Hélio Nóbrega, ‘Epitácio Pessoa’, Ed. A União, 2000.

sábado, 15 de julho de 2017

SERÁ QUE OS FRANCESES DECIDIRAM RESTAURAR A MONARQUIA?

Image may contain: 3 people, people smiling

“Será que os franceses finalmente perceberam o erro do seu regicídio e decidiram restaurar a Monarquia?” Esta pergunta foi a primeira frase do artigo de Jonathan Miller para a revista britânica “The Spectator”, de 4 de julho, um dia após o novo Presidente da França, Emmanuel Macron, ter “fascinado, seduzido e confundido” com seu discurso de uma hora e meia dirigido aos parlamentares franceses, tanto da Assembleia Nacional quanto do Senado, reunidos no Palácio de Versalhes – o magnífico monumento de Luís XIV, o “Rei-Sol”.

O Presidente Macron apontou os seus objetivos de governo, como uma profunda reforma das instituições políticas, o desenvolvimento da economia, a restauração da União Europeia e, acima de tudo, recuperar a antiga glória da França.

O mesmo Emmanuel Macron, em julho de 2015, quando era Ministro da Economia do Governo de François Hollande, em entrevista ao site jornalístico francês “Atlantico”, afirmou a necessidade de haver um Monarca: “A democracia comporta sempre uma forma de incompatibilidade, porque ela não basta a si mesma. Há entre o processo democrático e o seu funcionamento um [elemento] ausente. Na política francesa, este [elemento] é a figura do Rei, cuja morte eu penso fundamentalmente que o povo francês não desejava. O Terror causou um vazio emocional, imaginário, coletivo [...]. Tentou-se depois preencher este vazio [...]: são as eras napoleônica e gaulista, notavelmente. No tempo restante, [contudo], a democracia francesa não preencheu mais o espaço.”

Se é fato, atestado pelo próprio Presidente da República Francesa, que os franceses desejam e carecem de um Rei, ninguém melhor para sê-lo que o legítimo herdeiro dinástico da Monarquia francesa, o Príncipe Henri de Orleans, Conde de Paris, tetraneto do Rei Luís Filipe I dos Franceses. Sob a liderança desse nobre Príncipe da Casa de Orleans, o povo francês veria a reafirmação de seus valores e tradições, desenvolvendo um sentido de grande família entre todos os compatriotas e permitindo ao País ter seus olhos no futuro e no progresso, tomando por base segura a sabedoria e os valores do passado.

O Conde de Paris, como Chefe da Casa Real da França, ainda que viva em uma República, tem plena consciência de seu dever histórico para com o povo francês. Sua presença, assim como de sua Família, é frequentemente requisitada em diversos eventos em toda a França, evidenciando a boa relação, o respeito e o carinho que permanece entre a Família Real e seu povo.

No aspecto internacional, quanto a sua ligação com nossa Pátria, o Conde de Paris é primo-segundo do Príncipe Dom Luiz de Orleans e Bragança, Chefe da Casa Imperial do Brasil, por serem ambos bisnetos da Princesa Dona Isabel, a Redentora, e do Conde d’Eu. Além do parentesco, também se assemelham pelos valores cristãos que defendem, bem como pela História e Tradição que encarnam.

Imagem: quatro gerações de legítimos Reis da França, S.A.R. o Príncipe Henri, Conde de Paris, com seu segundo filho varão, S.A.R. o Príncipe Jean, Duque de Vendôme, o qual carrega nos braços seu primogênito, S.A.R. o Príncipe Gaston de Orleans, junto ao busto do anterior Conde de Paris, pai homônimo do atual titular.

"VIVA A REPÚBLICA!": UM TIRO CONTRA O IMPERADOR


"Representava-se ontem no Sant'Anna a "Escola dos Maridos", tradução de Arthur Azevedo, e nos intervalos apresentava-se ao público a prodigiosa violinista Giulietta Dionesi. S.M. o Imperador, que desejava conhecer a tradução, tanto que supondo-o impressa mandara procurá-la pelas livrarias, aproveitou o ensejo de ir ao teatro.

O Sant'Anna achava-se repleto: platéia e camarotes ocupados por pessoas da melhor sociedade; as galerias cheias da gente que de ordinário a freqüenta. No camarote imperial achavam-se, além de SS. MM. o Imperador e a Imperatriz, SS. AA. a Sra. Princesa Imperial e o Sr. D. Pedro Augusto e camaristas de semana. O espetáculo correu na melhor ordem. A atitude do povo era de todo o ponto pacífica e cortês. Nem se quer se poderia suspeitar que houvesse ali o elemento de desordem que mais tarde se revelou.

Terminado o espetáculo, o povo que enchia o teatro procurou as saídas. A família imperial dirigiu-se para a porta, indo na frente a Sra. Princesa Imperial, seguida de Sua Magestade o Imperador, que dava o braço a Sua Magestade a Imperatriz e do Sr. Príncipe D. Pedro.

O povo encostado para os lados, abria caminho a SS. MM., em silêncio. Ao chegarem ao vestíbulo do teatro, de um pequeno grupo de pessoas de baixa classe partiu um grito estentórico: "Viva o partido republicano". O Imperador parou imediatamente. Começou então uma confusão extraordinária. Grande número de pessoas prorompeu em vivas ao Imperador, acercando-se dele. As senhoras, tomadas de pânico, precitavam-se para o interior do teatro, de onde refluiam, empurradas pela onda dos que saiam. O tumulto generalizara-se: tanto na rua do Espírito Santo, como no largo do Rocio, nas circanias do teatro, vivas desencontrados se ouviram. Finalmente, pôde S.M. tomar o carro, seguindo acompanhado do piquete, que o guardava de espadas desembainhadas.

Ao passar, porém, pela frente da Maison Moderne, foram disparados três tiros de revólver na direção do carro que o conduzia. Asseguram-nos que um desses tiros quase alcançou o Sr. D. Pedro Augusto.

Felizmente S.M. o Imperador passou incólume. O sentimento da mais profunda indignação pintou-se em todos os semblantes dos que foram testemunhas desse baixo atentado. (...)" - Novidades, 16 de julho de 1889.

"Ontem à noite quando terminava o espetáculo no teatro Sant'Anna quando SS. Magestades Imperiais, SA. Princesa e SA. o Príncipe D. Pedro Augusto se dirigiam para o carro, um pequeno grupo de desordeiros levantou vivas à República. Travou-se então um conflito que pouco durou pois foi abafado pela intervenção do público sensato que também se retirava do teatro.

Quando o coche imperial seguia para a praça da Constituição, um indivíduo teve a leviandade de disparar um revólver evadindo-se em seguida para um estabelecimento próximo.

Pouco depois, porém, foi preso pelo povo um homem que se supõe ser o autor do atentado. À hora em que escrevemos esta ele sendo interrogado na 1a estação policial." - Diário do Commércio, 16 de julho de 1889.

SS. MM. e S.A. Imperial e S.A. o Príncipe D. Pedro, com seu séqüito, se retiravam do teatro Sant'Anna, à meia-noite de ante-ontem, quando no meio de um grupo que se achava à porta do mesmo teatro partiu um viva à República. Abafado esse viva sob palavras e vivas à monarquia, a D. Pedro II e à família Imperial, gerais e estrepitosos, houve um ligeiro conflito, que mais susto causou do que teve resultados funestos.

No meio desse tumulto, e aclamados pela multidão, puderam os Augustos espectadores tomar o seu coche e retirar-se com sua comitiva e guarda. Apesar, porém, da retirada de SS. MM. e AA.., a agitação continuou por algum tempo e propagou-se pela vizinhança do teatro.

Quando mais forte era o tumulto ouviu-se a detonação de um tiro de revólver, que foi dado próximo ao carro de SS. MM. quando este partia em direção do Paço da Cidade.

Grande foi a confusão que causou esse atentado, que ninguém podia prever nem esperar, o que deu lugar a ser impossível, na ocasião, prender-se o criminoso, que evadiu-se, aproveitando-se do barulho e ocultando-se no meio da grande multidão que estava no local.

Entretanto, o agente da polícia Paulino Alberto de Magalhães capturou o espanhol Ramon Gonçalves Fernandes sobre que caiam as suspeitas da autoria do crime. Em seu poder não foi encontrada arma alguma, nem foram suficientes as provas contra ele, pelo que foi posto em liberdade ontem de manhã.

Quando procediam as autoridades às primeiras diligências chegou ao seu conhecimento que era conhecido o autor do atentado, que havia sido visto pelo Sr. Antônio José Nogueira, empregado do Maison Moderne.

Por essas indicações, das 2 para as 3 horas da madrugada, o 1o delegado de polícia, Dr. Bernardino Ferreira da Silva conseguiu prender, em um bonde da Companhia de Botafogo, na rua de Gonçalves Dias, Adriano Augusto do Valle, que fôra acusado de ter disparado os tiros de revólver." - Diário do Commércio, 17 de julho de 1889.

"Ao terminar o espetáculo de ontem no teatro Sant'Anna, quando saíam suas magestades, houve um grande movimento de povo dando vivas à República uns e outros à monarquia, sendo em frente a Maison Moderne disparados alguns tiros.

Nós os republicanos nada temos com essas arruaças, que devem ser levadas somente à conta da polícia disfarçada e da guarda criada para garantia do trono." - República Brazileira, 16 de julho de 1889.

" (...) O desacato que sofreu o chefe do estado, alquebrado pelos anos e pela moléstia, junto à santa senhora que o acompanhava só pode ser levado à conta da loucura daqueles que a todo transe procuram indispor e vilipendiar o nosso partido. Apelamos para o próprio imperador, e ele, que com cosciência nos diga, se julga que haja nesta terra um "verdadeiro republicano" que seja capaz de atentar contra a sua vida! Revolucionários, sim, assassinos, nunca!" - República Brazileira, 17 de julho de 1889.

"Causou a mais viva impressão a notícia da deplorável ocorrência de ontem à noite, às portas do teatro Sant'Anna e suas circumvizinhanças.

Um grupo, quando o Imperador saía do teatro em companhia de sua augusta família, levantou vivas à república, o que produziu a maior confusão no povo, que em desafronta de Sua Magestade levantou vivas ao imperador.

Sua Magestade embarcou em seguida no seu coche, que partiu a trote largo, e afirmam várias pessoas que, no momento de passar aquele por defronte da Maison Moderne, ou Stat-Coblentz, ouviu-se a detonação de um tiro.

Este fato deu à ocorrência o vulto de um atentado, que comoveu profundamente a opinião.(...)

Não podemos acreditar que houvesse a intenção de atentar contra a pessoa do Imperador. Repugna a índole do nosso povo; não se conforma com os nossos sentimentos a premeditação de tal crime, contra o soberano que aboliu de fato a pena de morte. (...)" - Cidade do Rio, 16 de julho de 1889.

"Ontem, quando se retirava do teatro Sant'Anna, terminado o espetáculo, foi sua magestade obrigada a parar à porta de saída.

Grande multidão de indivíduos achava ali postada e dentre ela partiu um grito sedicioso. Sua Magestade parou e no mesmo instante viu-se cercado por todos tantos o acompanhavam.

Ao passar o carro em frente à Maison Moderne, ouviu-se a detonação de alguns tiros. Fácil é de imaginar-se o tumulto produzido por este fato.

O piquete de cavalaria, que gurdava a carruagem imperial, marchou em disparada, acompanhando-a pela rua da Carioca, por ter o cocheiro fastigado os animais, afastando-os do lugar tumultuoso.

A polícia compareceu imediatamente e foram dadas várias ordens para conhecer-se qual o autor do atentado, até então desconhecido.

Intimadas várias pessoas para virem à Polícia, conseguiu por fim o dr. Bernardino Ferreira, 1o delegado, conhecer a verdade, por denúncia de um cavalheiro. (...)

A população brasileira foi hoje dolorosamente impressionada, tomando-se da mais justa indignação pelo estúpido atentado cometido ontem, à noite, contra Sua Magestade o Imperador, quando este retirava-se com Sua Magestade a Imperatriz do teatro Sant'Anna.

Era o sr. D. Pedro II o único soberano deste século contra quem não tinha havido atentado de espécie alguma e isso abonava principalmente a brandura do coração brasileiro e dos nossos costumes.

Infelizmente, houve ontem um atentado que não podemos atribuir senão à inconsciência de quem o praticou: ou loucura ou embriaguez, pois, por honra do partido republicano, não acreditamos que tal ato dele partisse. Esse triste acontecimento é ainda uma das consequências da profunda anarquia que lavra nos espíritos do Brasil, onde todas as noções de direito, dever e liberdade acham-se completamente obliteradas." Gazeta da Tarde, 16 de julho de 1889. 

AS MANCHETES 

Atentado Contra o Imperador
Tiros de Revólver
Prisão do Criminoso (Novidades)
Lamentável (Diário do Commércio)

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Vista do interior de Curuzú, 20 de setembro de 1866

Tolstoi estava tristemente correto ao escrever que um povo feliz não tem história. Daí lançar-se mão para lembrar as pessoas de que elas têm motivos para estarem infelizes e que é preciso “remediar” o passado. “O Brasil tem uma dívida histórica com o Paraguai, que se pode pagar com a concessão de um tratamento diferenciado nas relações entre os dois países. No caso de Itaipu, o Brasil deveria pagar a preço de mercado – e não a preço de custo, como prevê a parceria – a energia excedente que o Paraguai não consome”, afirmou, em entrevista, o novo presidente paraguaio, Fernando Lugo, invocando, em nome de questões atualíssimas, a velhíssima Guerra do Paraguai (1865-1870). “O presidente Hugo Chávez recordou ao presidente Lugo sua admiração pela luta histórica do povo paraguaio, digno herdeiro da memória do marechal Francisco Solano López, e coincidiram na necessidade de continuar construindo a União de Nações Sul-americanas sobre a base da reivindicação da história de luta de nossos povos”, reitera a nota emitida pela chancelaria venezuelana sobre o telefone dado por Chávez ao colega recém-eleito.

“López foi o grande patriota latino-americano, humilhado pela aliança da tríplice traição a América Latina, seus homens e suas mulheres”, declarou recentemente a presidente argentina, Cristina Kirchner, que batizou uma unidade do Exército argentino em homenagem a López. A tese da “dívida histórica” é dividida também por brasileiros, como o senador Cristovam Buarque, que defende mudanças no acordo sobre Itaipu: “Não podemos simplesmente negar ao Paraguai o direito de pedir o reajuste. Nós não podemos esnobar o Paraguai. Até porque temos uma dívida com esse nosso país vizinho, já que há 138 anos matamos 300 mil de seus cidadãos na Guerra do Paraguai. Em proporção, seria como se matassem 9 milhões de brasileiros”. Não é de hoje que ditadores, como Stroessner, e militantes de esquerda se unem na condenação da Guerra do Paraguai como um “massacre imperialista” feito pelo Brasil, em suposto conluio com a Inglaterra, que teria dizimado as chances de grandeza paraguaia, ou nas palavras de Lugo: “Há um reconhecimento da dívida histórica com o Paraguai. Acreditamos na Justiça e o Paraguai deveria voltar a ocupar o lugar que ocupava: o país mais desenvolvido, o mais unido, que tinha um projeto econômico diferenciado”.

Assim, por mais inusitado que possa parecer, o presente é um ótimo momento para voltar a falar de figuras-chave de um conflito tão antigo. Como na nova biografia do general Osório (General Osório, Companhia das Letras, 262 páginas, R$ 35,50), lançada no bicentenário de seu nascimento, escrita pelo historiador Francisco Doratioto, autor de Maldita guerra, uma história revisionista da Guerra do Paraguai, que põe abaixo mitos como o extermínio da população masculina paraguaia, os ideais modernizantes de López e a vitimização do Paraguai. “Quem fala em traição ou está mal informado ou tem segundas intenções. López foi o agressor, que invadiu os vizinhos. Não houve a tal industrialização paraguaia e nunca existiu a tal idade de ouro do Paraguai. López não era um paradigma de progresso, de luta contra o imperialismo, nem um construtor de sociedades modernas”, explica. “O revisionismo argentino e uruguaio é de esquerda e o paraguaio era um nacionalismo de direita que buscava legitimar um ditador como Stroessner usando a figura de outro ditador, López”. A história não foi bem servida em nenhum dos casos. “No Paraguai, a exaltação de López serviu à ditadura; no Brasil, a satanização da guerra e do comando brasileiro serviu de arma de combate à ditadura”, observou, com sabedoria, José Murilo de Carvalho.

A confusão sobre a real dimensão do conflito e de seus personagens, porém, não se restringe apenas a interesses comerciais ou oportunismo político. O comandante do Exército brasileiro no Paraguai, Osório, também sofreu com a reescrita interessada da história. “O Exército de Caxias, como se autodenomina hoje a instituição, foi por um bom tempo o Exército de Osório e essa mudança só pode ser entendida se relacionadas as trajetórias política e militar dos dois generais com o contexto histórico em que foram adotados como personagens paradigmáticos”, avisa Doratioto. “Afinal, embora nos dias atuais eles sejam lembrados como militares, também foram políticos e, em certas épocas, se dedicaram mais à política que ao Exército”. O Partido Conservador, pelo qual Caxias se elegeu senador, defendia o Estado centralizado e a manutenção da ordem social. Osório era do Partido Liberal, que priorizava a descentralização do poder e a maior participação dos cidadãos no processo político. Caxias era o Exército de elite, formado na Academia, enquanto Osório era o Exército que vinha de baixo (e que, na velhice, confessou seu horror pela vida militar) e que relevava pequenas transgressões, formalismos e aparências. Daí a razão da jovem República, feita por golpe militar, nota Doratioto, sem ter símbolos, ter que descobrir em Osório o “pré-republicano”, a ponto de, em 1894, Floriano Peixoto dirigir uma manifestação popular para a inauguração da estátua do general no Rio de Janeiro, na atual Praça XV.

“Foi o primeiro general brasileiro a pisar no território paraguaio e enquanto Caxias e outros militares e políticos brasileiros desconfiavam do presidente argentino Mitre (o líder da Tríplice Aliança contra o Paraguai), afirmando que ele agia para prolongar o conflito, quer devido a ganhos financeiros que proporcionava à Argentina, quer para enfraquecer o Império, Osório foi um dos poucos militares brasileiros que não partilhavam desse sentimento”, afirma Doratioto. O aventureiro inglês Richard F. Burton, cônsul inglês em Santos e observador britânico no cenário da guerra, relatou que os soldados admiravam Osório e acreditavam que “ele tinha o corpo fechado e, depois dos combates, sacudia o poncho para as balas caírem”. O general era visto, pelos colegas de hierarquia, como “irresponsável” pela maneira como colocava a vida em risco durante os combates. Na Batalha do Avaí, um tiro destruiu seu maxilar, mas, mais tarde, quando Caxias foi substituído pelo conde d’Eu no comando militar das tropas, não fugiu ao dever e voltou ao fronte para lutar.

Exército brasileiro desembarcando no território paraguaio

No ataque à fortaleza de Humaitá, principal baluarte de defesa de López, Osório foi enviado por Caxias para averiguar o sucesso do bombardeio fluvial feito pela esquadra aliada. Enfrentando resistência, afirmou ter recebido ordens de Caxias (que nunca confirmou ter dado tal comando) para recuar, provocando pesadas perdas. “O episódio deixou feridas, exploradas por lideranças liberais, que passaram a apresentar Osório como vítima de Caxias, porque este o veria como rival”, observa o autor, que lembra como, ao fim do conflito, “Osório era, à exceção de Pedro II, o brasileiro mais popular, um fato desconfortável para o governo conservador”. Logo, é fácil compreender por que durante 4 décadas a principal comemoração militar brasileira ocorria no aniversário da Batalha de Tuiuti, onde Osório foi o herói do dia. Mais complexo é entender o “rebaixamento” do general a partir dos anos 1920 seguida pela elevação de Caxias, até então uma figura secundária, ao posto de Patrono do Exército.

Reinvenção

Trincheiras de Tuiuti, batalha de 24 de abril de 1866

“Em contraponto ao ‘esquecimento’ de Caxias, havia uma celebração de Osório como grande militar, um culto em boa medida espontâneo”, avalia o historiador Celso Castro, para quem as razões dessa mudança estão na preocupação do Exército com as agitações “tenentistas”, que levariam à Revolução de 1930. “Mais do que a reorganização de uma instituição fragmentada, ocorreu uma reinvenção do Exército como instituição nacional, herdeira de uma tradição específica e com um papel a desempenhar na construção da nação brasileira”, afirma Castro. Para tanto, foi preciso “inventar” um Caxias adequado ao novo papel simbólico exigido. “Os predicados atribuídos a Caxias – de um general disciplinado e apolítico – são parte dessa imagem criada no século XX, atendiam a interesses de uma República nacional conservadora que se esforçava para conter a indisciplina militar. Esses predicados, porém, caracterizam um ‘ser militar’ que não existia no século XIX”, analisa a historiadora Adriana Barreto de Souza, autora da tese de doutorado O Duque de Caxias e a formação do Império brasileiro. “Entronizado nesse panteão, e após 21 anos de ditadura militar, o diálogo com Caxias se tornou mais difícil, pois ele era ou tratado com admiração irrestrita por militares, ou demonizado como patrono do Exército pela oposição que se fazia ao golpe de 1964. Ele virou o “duque-monumento”, observa Adriana.

Se de início a troca da guarda Osório por Caxias serviu como forma de valorizar a legalidade e o afastamento da política, a partir do Estado Novo varguista essa mudança, embora mantida, adquiriu novos tons: “Passou-se a ressaltar as qualidades do duque como chefe militar a serviço do Estado forte e centralizado, tal qual o da ditadura de Vargas”, avalia Doratioto. Essa instrumentalização persistiu após 1964, quando os militares no poder colocaram em relevo as características de Caxias que interessavam à situação vigente, como a de ter sufocado movimentos revolucionários. “Essas foram de fato suas características e, à exceção do princípio da centralização, também as de Osório. Contudo os dois generais tinham ainda como características a subordinação ao poder civil, a aversão ao caudilhismo e a repulsa ao militarismo, mas estas os ideólogos do autoritarismo não tinham interesse em lembrar e os da democracia negligenciaram em recuperar.” Infelizmente, por vezes, é mais conveniente esquecer a frase de Tolstoi e trocá-la pelo pragmatismo de um Bismarck: “A história é um simples pedaço de papel impresso; o principal é fazer história, e não escrevê-la”.

LINK ORIGINAL: REVISTA PESQUISA - https://goo.gl/73ZgH2

domingo, 9 de julho de 2017

O IMPERADOR “BUSINESSMAN”

Image may contain: 1 person

Assim que assumiu a Regência do Reino do Brasil, em 1821, o então Príncipe Real de Portugal, Brasil e Algarves, Dom Pedro de Alcântara de Bragança, tomou fama de avarento, pois, chocado com o mau estado das finanças, iniciou um arrocho nas contas públicas. O desespero que sofreu diante da situação financeira nacional o acompanhou até o fim da vida, tanto na esfera pública quanto na pessoal, moldando o perfil do jovem futuro Soberano.

Com destreza e pulso firme, o Príncipe Real Regente reverteu as adversidades das finanças do então Reino do Brasil. Após a Independência do Brasil, o agora Imperador Dom Pedro I, para não depender de dinheiro público ou de empréstimos quando suas despesas ultrapassavam a dotação concedida pela Assembleia Geral, empreendeu em uma série de negócios.

Conta-se que, em 1828, o Imperador arrendava a Imperial Fazenda de Santa Cruz para o gado que passava da Província de Minas Gerais para a Província do Rio de Janeiro, produzia e vendia capim na capital do Império, além de pessoalmente fabricar cachaça, que era vendida em uma série de botequins que pertenciam a Sua Majestade e em outros estabelecimentos da capital (o próprio Imperador era abstêmio, não bebia). Além disso, checava minuciosamente as prestações de contas até da cozinheira do Palácio de São Cristóvão, de maneira que não ultrapassassem o limite que havia imposto.

Com estas atividades econômicas, o Soberano conseguiu juntar dinheiro em bancos estrangeiros, utilizando toda oportunidade para poupar. Quando teve que deixar o Brasil, em 1831, após sua abdicação, Sua Majestade não mexeu nas finanças públicas, utilizando somente suas economias, que rapidamente acabaram, com os esforços preparativos para Guerra Civil Portuguesa, o antigo Imperador, agora Duque de Bragança, precisado vender sua prataria e joias para se manter em Londres e Paris, na busca de apoio militar e financeiro, com o intuito de depor seu irmão, o Rei Dom Miguel I, que havia usurpado o Trono de Portugal.

Seu respeito para com o dinheiro público foi herdado por seu filho e sucessor, o Imperador Dom Pedro II, que em quase 50 anos de reinado pessoal, nunca alterou sua dotação, que diminuiu cinco vezes o valor inicial, em decorrência da inflação ao longo das décadas de seu reinado, recusando qualquer tipo de acréscimo, por exemplo, quando fez suas viagens ao exterior. No entanto, o Soberano nunca teve o tino de seu pai para os negócios, dependendo de empréstimos com amigos para se manter nos períodos mais difíceis, vinte e quatro no total, aos quais sempre honrou.

Tanto pai quanto filho sempre usaram o que recebiam do Estado para o melhor desempenho da própria Nação, como, por exemplo, oferecendo bolsas de estudo para o exterior, somente o Imperador Dom Pedro II patrocinou, do próprio bolso, 151 estudantes, mais de quarenta para formação acadêmica no exterior, e, em um dos momentos mais difíceis do Brasil, a Guerra do Paraguai, Sua Majestade doou um quarto de sua dotação anual para as despesas de guerra, visando, inclusive, evitar o aumento de impostos com o prolongar do conflito. Também diferente de seu pai, nosso segundo Imperador nunca guardou dinheiro, pois partia do princípio de que a dotação ou outros proveitos deveriam integralmente ser gastos em beneficio da Pátria, como o próprio escreveu: “Não ajunto dinheiro”.

- Baseado em trecho do livro “Revivendo o Brasil-Império”, de Leopoldo Bibiano Xavier.

sábado, 8 de julho de 2017

A MONARQUIA NAS AMÉRICAS

Image may contain: 4 people, people smiling, outdoor

Sucessivas gerações, vitimadas pela propaganda anti-monárquica que se estabeleceu no Brasil após o golpe de 15 de novembro de 1889, tiveram cravado fundo no seu subconsciente político a ideia de que a Monarquia, banida de uma vez de nosso Continente com a independência dos Estados Unidos e com a queda da Monarquia no México, e depois no Brasil, se tornara de vez incompatível com o solo americano.

Tão fundo se lhe cravara essa convicção que, a não poucos de nossos compatriotas, causaria surpresa deitar a atenção sobre o exemplo naturalmente bem sucedido da Coroa Britânica, a refulgir com êxito e tranquilidade sobre as imensas vastidões do Canadá. De fato, ainda na semana passada, o Canadá comemorou seus 150 anos, com uma Monarquia vigorosa e popular, e o herdeiro do Trono, o Príncipe de Gales, acompanhado de sua esposa, a Duquesa da Cornualha, representou sua mãe, a Rainha Elizabeth II do Canadá, que, devido à idade avançada, já não faz mais viagens de longa distância, nas celebrações.

Surpresa ainda maior seria descobrir que há ainda outras Monarquias nas Américas, além do Canadá: a Soberana Britânica reina sobre outros nove países americanos, como Jamaica, Belize e Bahamas. Ou que, no extremo norte do Continente, a Groenlândia é um território da Coroa da Dinamarca, e ainda que três ilhas caribenhas, Aruba, Curaçau e São Martinho, integram o Reino dos Países Baixos.

Assim sendo, dizer que o regime monárquico é incompatível com o solo americano é uma grande falácia! Afinal, não experimentou o Brasil 67 anos de estabilidade, progresso e prestígio internacional durante o Império, enquanto a América Latina ia se dividindo em uma verdadeira colcha de retalhos, formada por republiquetas governadas por tiranetes e caudilhos e guerreando entre si? Os canadenses não têm a felicidade de desfrutar da continuidade, seriedade e honradez da Monarquia, quando comparados aos seus vizinhos estadunidenses, quanto mais após o espetáculo de baixíssimo nível que foram as eleições presidenciais do ano passado?

Mesmo na Argentina e nos Estados Unidos, que nunca estiveram sob a forma de governo monárquico após se tornarem independentes, há florescentes movimentos monarquistas, visando uma união de coroas com a Espanha e o Reino Unido, respectivamente. Ainda nos Estados Unidos, o “The New York Times”, maior jornal do País e referência jornalística mundial, que muitas vezes adota uma postura mais à esquerda, publicou um editorial, em novembro do ano passado, no auge do embate entre o republicano Donald Trump e a democrata Hillary Clinton, dizendo “Considere uma Monarquia, América”.

Não faltam razões para o Brasil restaurar sua Monarquia, e um crescente número de brasileiros parecem concordar com tal afirmação. E quando o Império do Brasil voltar a ser realidade, será apenas uma “volta para a casa”, um retorno a uma ordem natural que jamais deveria ter deixado de existir.

Foto: SS.AA.RR. o Príncipe de Gales e a Duquesa da Cornualha, na histórica Carruagem de Estado, junto ao Governador-Geral do Canadá, David Johnston, e sua esposa, Sharon Johnston, na Colina do Parlamento, na capital canadense de Ottawa, nas celebrações dos 150 anos do Canadá.

O Brasil é uma democracia ou uma ditadura?

Imagem relacionada

O Brasil é uma democracia? A grande maioria das pessoas acredita que democracia seja, simplesmente, ter o direito ao voto. Essa desinformação é um dos principais motivos pelos quais não há democracia no Brasil. Poder votar é um direito existente em uma democracia, mas não o único. Para entender melhor porque o Brasil não é uma democracia, é preciso voltar à origem.

Democracia vem do grego e significa governo do povo. Historicamente, e em vários países desenvolvidos nos dias de hoje, a democracia transformou-se em um governo dos distritos, ou das comunidades. É importante denotar que o termo grego, dēmokratía, surgiu para limitar o poder da aristokratia, que significa “governo dos melhores”. A aristocracia surgiu para limitar o poder da monarquia, que significa “governo de uma só pessoa”.

Esses termos praticamente exemplificam todos os modelos de poder, seja os presentes em qualquer sistema politico tanto da atiguidade, como também os de hoje em dia. Aristoteles já argumentava que essas três forças só atingem equilibrio dentro de uma constituição. Tradicionalmente o monarca fazia, a aristocracia julgava o que era feito e a democracia negava qualquer excesso através de leis.

Mais tarde Montesquieu denominou o poder de fazer como poder executivo, o poder de julgar como judiciário e o poder de legislar como o legislativo, incorporando essas três forças cardinais e virtuosas. Como o poder executivo e judiciário sempre foram exclusivos para poucos, a porta de entrada do povo no sistema político foi sempre o legislativo.

O Brasil é uma democracia? Não!
O que acontece no Brasil e na maioria dos paises emergentes e em desenvolvimento do ocidente, é que o poder executivo e o poder judiciario tem consistentemente limitado o poder legislativo. Como? Primeiro limita-se o acesso ao poder legislativo através de um processo eleitoral demasiadamente caro. Isso faz com que a classe média, a maior contribuidora de tributos, não tenha recursos financeiros para se tornar um vereador, deputado estadual ou deputado federal. Segundo ponto é a limitação do poder legislativo com sua submissão aos outros dois poderes. O poder executivo  compra os parlamentares quando elabora os orçamentos ao travar seu livre arbítrio, e o poder judiciário limita a ratificação de leis e interfere nos processos do legislativo re-interpretando princípios e termos da constituição aleatoriamente.

Será que temos de fato uma democracia, ou uma autocracia com direito a voto?

A realidade política do Brasil nos últimos 30 anos tem sido essa falha descrita acima. Temos cada vez mais uma democracia de fachada com aumento gradativo de limitações pelo sistema, ou em outras palavras, temos uma autocracia, o “auto governo”. O que temos no Brasil é uma ditadura institucional, algo bem diferente de uma ditadura carismática baseada em um só líder, mas que pode ser igualmente danosa e de difícil deposição.

Uma democracia representativa depende de um sistema de representantes legítimos, seja com membros eleitos, como deputados e vereadores, ou com membros nomeados, como diretores de agências reguladoras. O vício criado pela nossa imperfeição organizacional transforma políticos e burocratas em comandantes da coisa pública, e o povo não tem escolha a não ser obedecer sem questionar as leis e normas, muitas sem critério.

É por causa dessa ditadura institucional que vemos as mesmas famílias sempre ocupando diversas áreas do poder público,  protegendo uns aos outros, enquanto limitam ações que visam trazer mais transparencia a todo o sistema político. Chamar de democracia um país em que governantes monopolizam o Estado e sua máquina administrativa, e em que a população só tem voz nas urnas, e para votar sempre nas mesmas pessoas, é um tanto demais.

Há um desequilibrio entre os três poderes no Brasil, e o perdedor tem sido consistentemente a democracia. A perpetuação desse desequilíbrio ao longo do tempo traz consequencias graves, como a constante transferência de riquezas do povo para os agentes dos outros dois poderes. Nenhum povo em livre exercicio de suas habilidades, ou em sã consciência, se auto impõe impostos injustificaveis e uma burocracia sufocante.

Equilibrar os poderes no sistema politico do Brasil é necessário, mas depender de um sistema equilibrado não é o bastante. Os países desenvolvidos já evoluiram para essa compreensão. Mas antes vamos definir nossos problemas para que em outros artigos possamos resolve-los. Acompanhe e compartilhe para ampliar nossa base de debate.

LINK ORIGINAL: LPBRAGANCA - https://goo.gl/KV4wmE

segunda-feira, 3 de julho de 2017

Ituzaingó: a história do hino brasileiro que teria sido roubado por argentinos

Música foi levada como troféu após batalha do Passo do Rosário, em 1827

Os arqueólogos com detectores de metais que esquadrinham o ventre do pampa, em Rosário do Sul, na fronteira gaúcha, não buscam apenas vestígios da maior batalha já travada em solo brasileiro, há longínquos 186 anos.

Cada peça que estão desencavando — bala de canhão, cabo de espada, projetis, estribos, pistolas, uma fivela que seja — ajuda a revelar um episódio que até hoje intriga, surpreende e pode reacender antigas pendências.


Tudo começou durante o combate do Passo do Rosário, em 20 de fevereiro de 1827, entre os exércitos do Império do Brasil e das Províncias Unidas do Rio da Prata (Argentina). Para comemorar o sucesso brasileiro, o qual dava como favas contadas, dom Pedro I teria mandado compor a Marcha da Vitória. Mas o plano de Sua Majestade Real falhou: em um confronto cujo resultado é motivo de discórdia até agora, os castelhanos levaram a música como troféu.

Além de cantar vitória, os argentinos rebatizaram a melodia de Marcha de Ituzaingó — a versão castelhana para o nome Passo do Rosário. Foram além: anunciaram que o próprio Pedro I criara a obra. E foram mais adiante ainda: desde então, tocam a música nos quartéis e nos rapapés ao presidente do país. No momento, os três minutos e 57 segundos de acordes vibrantes homenageiam Cristina Kirchner.

Nos últimos dias de abril, ZH acompanhou as investigações arqueológicas em Rosário do Sul, onde 7,5 mil argentinos e uruguaios se bateram contra 5,1 mil brasileiros quase dois séculos atrás. As pesquisas são feitas pela entidade Campos de Honra, do Uruguai, que reúne cientistas, militares e especialistas em diversas áreas — desde a prospecção no subsolo à conservação dos objetos em museus.


O projeto está em andamento, a conclusão dependerá do volume das descobertas e da vontade dos governos em permitir desencovar um passado constrangedor. Nenhuma nação tolera perder os símbolos pátrios. Recentemente, o Paraguai insistiu para que o Brasil devolva o canhão El Cristiano (o cristão é referência ao fato de ter sido construído a partir do metal fundido de sinos das igrejas de Assunção), tomado durante a Guerra da Tríplice Aliança (1864-70).

Pesquisa une os três países

É remota a chance de que a equipe do Campos de Honra (Campos de Honor) localize algum fragmento da Marcha da Vitória, como um pedaço de clarinete, uma corneta ou um parafuso borboleta de tambor. No entanto, as mais de 40 peças encontradas no final de abril — a maioria de armamentos — podem indicar em quais circunstâncias os generais castelhanos se apropriaram da música.

— Cada material tem uma cédula de identidade, traz uma informação valiosa — ressalta o investigador histórico de campos de batalha, argentino Diego Lascano.

Se os mandatários de 1827 eram adversários, reproduzindo nos confins da América do Sul a eterna disputa entre Portugal e Espanha, os historiadores atuais compartilham suas pesquisas. Trocam conhecimentos para elucidar o mistério.

No Rio Grande do Sul, Carlos Fonttes vasculhou relatos de combatentes do Passo do Rosário, como o do argentino José María Todd, que atestam a subtração da marcha. Porém, é cauteloso quanto à autoria dela.

— Não há provas de que seja de dom Pedro I, porque a partitura não está assinada — observa Fonttes, delegado da Academia de História Militar Terrestre do Brasil (Ahimtb), em Uruguaiana.

No lado da Argentina, o historiador Luis Furlan confirma a existência da marcha, executada pela primeira vez em 25 de maio de 1827 — três meses após a batalha. Furlan diz que a partitura está registrada no Instituto Universitário Nacional de Arte — Departamento de Artes Musicais, de Buenos Aires, sob o número CP41-1293.

Há versões sobre como a música foi apreendida. Uma delas é de que estava num baú, abandonado por soldados da banda imperial durante a retirada. Outra é de que foi achada na mochila de um oficial morto. Para Furlan, o incontestável é que o seu país adotou oficialmente a marcha surrupiada do Brasil:


— É evidente que se respeitou e valorizou, e até se concedeu um lugar de distinção, como demonstram as solenidades em que é executada.

Resquícios de batalha

A equipe arqueológica Campos de Honra tenta reconstituir, a partir da descoberta de armas e objetos, uma batalha que envolveu as elites militares europeia e sul-americana.

Veteranos das guerras prussianas e napoleônicas combateram com astutos caudilhos do pampa, exímios cavaleiros guaranis do Rio Grande do Sul e esquadrões de lanceiros formados por escravos libertos do Uruguai. Uma mistura de estratégias, raças e valentias. De 24 a 28 de abril, os integrantes do Campos de Honra perscrutaram uma área de 20 hectares, em Rosário Sul, onde os exércitos se enfrentaram há 186 anos. Foram localizados fragmentos de granadas, balas de canhão, gatilhos e balins, mais varetas de socar canos de carabinas, estribos e pederneiras.

As pesquisas se baseiam em documentos da época. Na varredura com detectores de metais, os arqueólogos se guiaram por um mapa feito em 1827 pelo capitão-engenheiro Adolph Friedrich von Seweloh, alemão que era o ajudante do Marquês de Barbacena, o comandante do exército imperial no Passo do Rosário (Ituzaingó).

– Os objetos revelam os movimentos da guerra, a posição das artilharias, os ataques das cavalarias, a direção dos tiros – informa o diretor do Campos de Honra, Diego Lascano.


Não é a primeira prospecção feita no lugar. Em 1957 (130 anos depois), foram exumados os despojos dos combatentes. Armas inteiras – rifles, sabres e espadas – estão nos acervos do Regimento Passo do Rosário (4º RCC) e do Museu Honório Lemes, em Rosário do Sul. Moradores da região também encontraram peças, as quais guardam em casa.

Empate técnico ou vitória inconclusa?

Mas quem ganhou o confronto no verão de 1827, de aproximadamente seis horas de duração? Historiadores argentinos garantem que foi uma vitória castelhana, pois o Brasil tomara a iniciativa da retirada.

Contrapondo-se, estudiosos daqui argumentam que a manobra foi necessária, porque o vento soprava um incêndio (causado pelas granadas no capim seco) contra as tropas imperiais.

Com 1.913 cavaleiros e 500 infantes a menos, o Exército Brasileiro escapou de um desastre graças à pontaria dos artilheiros. Aquele que viria a ser a mira do Império, Emilio Mallet, comandava a 1ª Bateria. Os quadrados de infantaria – soldados atirando de fuzil, de pé e ajoelhados – repeliram a cavalaria inimiga durante a retirada. Por fim, ambas as forças recuaram aos acampamentos, a soldadesca exausta e sedenta com o calor de fevereiro.

– Os dois exércitos ficaram inertes, sem condições de luta. Não houve uma vitória conclusiva – avalia o coordenador do Campos de Honra, o uruguaio Marcelo Díaz Buschiazzo, professor de História Militar.

O maior vitorioso foi o Uruguai, que conseguiu sua independência, deixando de pertencer ao Império do Brasil. Depois de Passo do Rosário ou Ituzaingó, Dom Pedro I desistiu de anexar a província rebelde.

LINK ORIGINAL - ZH: https://goo.gl/Xixk1t

sábado, 1 de julho de 2017

FIRMEZA DE PRINCÍPIOS

A Família Imperial no exílio
(de pé) Dom Luis Maria e sua esposa, a Princesa Dona Maria Pia. (sentados) Dona Isabel e seu marido, o Conde d'Eu. (crianças - da esq) Dom Pedro Henrique, Dona Pia Maria e Dom Luis)


No ano de 1912, foi apresentado um projeto de lei na Câmara dos Deputados, visando revogar a Lei do Banimento da Família Imperial Brasileira, sob a condição de que todos os seus membros renunciariam aos seus direitos dinásticos e sucessórios.

Na ocasião, o segundo filho e herdeiro da Princesa Dona Isabel, a Redentora, então Chefe da Casa Imperial e Imperatriz “de jure” do Brasil, o Príncipe Imperial do Brasil, Dom Luiz de Orleans e Bragança, escreveu a seu amigo, Visconde de Ouro Preto:

“Quanto à revogação da Lei do Banimento que pesa sobre nós, devo desde já lhe dizer – e convém que todos o saibam – que só a tomaremos em consideração se for suprimido o seu artigo II, que subordina essa revogação à renúncia, por parte dos membros de nossa Família, que dela se prevalecerem, dos seus direitos presentes e futuros ao Trono do Brasil.

Se esta condição for mantida, pode estar certo de que nenhum de nós a aceitará, não porque seja difícil renunciar a direitos, mas porque a par destes existem deveres, conseqüência e razão de ser dos primeiros, e ao dever ninguém pode dignamente renunciar.

Por graça de Deus e aclamação do Povo, foi a nossa Família outrora colocada à frente da Nação Brasileira. O nosso dever é, pois, ficar perpetuamente às ordens da Divina Providência e à disposição da nossa Pátria, para ser, nos momentos de crise que se apresentam, o seu supremo recurso, o seu instrumento de unidade, coesão e grandeza.

Hoje, o Brasil, ou melhor, o Brasil oficial, supõe não precisar desse instrumento, mas quem sabe se amanhã não surgirão complicações, interiores ou externas, em que a todos pareça necessário recorrer de novo ao regime que já foi, na terrível crise da Independência e outras, a salvação do Brasil, e durante mais de meio século lhe deu ordem, progresso, paz e liberdade, no interior, glória e prestígio, perante o estrangeiro.

Renunciar a esse dever sagrado seria mais que falta de caráter, seria um crime de lesa-patriotismo.
O exílio é duro; ao exílio, porém, e mesmo a um exílio perpétuo nos resignaremos, de preferência a aceitar o pensamento de atraiçoar o nosso dever, a nossa Pátria!”

Enquanto viveu o Príncipe Imperial Dom Luiz, a República Brasileira se sentiu insegura e temerosa, sempre vendo no brilhante e ardoroso herdeiro da Coroa um perigo mortal. Foi somente alguns meses após ter chegado ao Brasil a notícia de seu falecimento prematuro – devido ao agravamento de doença que contraíra nas trincheiras da Primeira Guerra Mundial –, que, no ano de 1920, o Presidente Epitácio Pessoa revogou Lei do Banimento, uma medida que, havia muito, a consciência nacional vinha reclamando.

- Baseado em trecho do livro “Dom Pedro Henrique – O Condestável das Saudades e da Esperança”, de Armando Alexandre dos Santos.