Na mesma sessão, os senadores lembraram um crime coletivo ocorrido em Itu, em São Paulo, no começo do ano. Um escravo havia assassinado seu senhor, um dos poucos médicos da cidade. Enfurecidas, centenas de pessoas tentaram invadir a delegacia para linchar o criminoso, mas foram contidas pela polícia. No dia seguinte, voltaram e conseguiram arrancar o escravo da cela. O negro foi morto a pauladas pela população aos gritos de “viva a justiça do povo!”
Para os senadores, linchamentos como aquele, que se repetiam em outras cidades, eram um claro sinal de que a sociedade — vendo que os cativos, livres da pena de morte, se sentiam encorajados a assassinar — não tinha escolha senão fazer justiça com as próprias mãos.
O senador Silveira da Mota foi ainda mais longe e disse que, já que a lei de 1835 havia sido esquecida, o melhor seria acabar de vez com a escravidão:
— Nós sabemos que a escravidão é uma violência e uma injustiça, mas as violências se mantêm senão com outras violências. Se quereis fazer filantropia à custa da honra das famílias dos proprietários, então tomai a responsabilidade da emancipação [dos escravos]. Não o queirais fazer tortuosamente, com prejuízo de tantas vidas. Num país de escravidão, se o governo quer harmonizar a lei criminal com os princípios filosóficos, então o meio é outro, é acabar com a escravidão. Enquanto não acabar com ela, o meio é a lei de 1835.
Ainda em 1879, o presidente do Conselho de Ministros (cargo equivalente ao de primeiro - ministro), Cansanção de Sinimbu, compareceu ao Senado para defender o imperador. Ele argumentou que dom Pedro II concedia a clemência não por bondade, mas por identificar falhas nos processos judiciais:
— Todos nós sabemos como têm lugar esses assassinatos. Acontecem em lugares solitários, na ausência de pessoas que possam testemunhar e, por conseguinte, na dificuldade de se constituírem provas positivas para se fazer um juízo sobre a criminalidade do réu.
O primeiro - ministro não contou toda a história. Quando o processo era perfeito, sem deixar dúvida de que o escravo matou seu senhor, o imperador simplesmente engavetava o pedido de clemência. Assim, em vez de ir para a forca, o negro continuava na prisão indefinidamente, à espera de uma palavra final do monarca que jamais viria.
A lei da pena de morte dos escravos deixou de fazer sentido em 1888, com a abolição da escravidão. Ela só foi oficialmente revogada em 1890, logo depois da Proclamação da República.
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