"Petersburgo está repleto de impressões sobre a tragédia de Lisboa. Todas as conversas abordam apenas esse tema... A missão portuguesa, situada na Rua Mokhovaia, a partir das duas horas, ficou cercada de coches e pessoas que vieram apresentar condolências", noticiava a Agência Telegráfica de São Petersburgo.
Esta agência informava também que recebeu "a primeira notícia apenas às 9 horas da manhã, visto que o telegrama chegou com significativo atraso devido a uma avaria na linha".
"Assassinato do rei de Portugal e do Príncipe herdeiro", titulava o diário Russkoe Slovo no dia 04 de Fevereiro.
"Às seis da tarde, na Rua do Arsenal, o rei Carlos e o príncipe herdeiro, que regressavam num coche aberto de Vila Viçosa, foram assassinados a tiro. No mesmo coche seguiam a rainha D. Amélia e o infante Manuel. O infante foi ligeiramente ferido e a rainha saiu ilesa", escrevia o correspondente desse jornal em Lisboa.
Segundo o correspondente russo, "logo após o assassinato, começou a correr o boato de que o crime foi obra de uma conjura, de que a polícia estava ao corrente. O facto de os assassinos terem sido mortos no local e não detidos... é visto como uma intenção da polícia esconder os rastos da conjura. Se a polícia estivesse minimamente vigilante, o assassinato teria sido impossível".
Quanto à autoria do crime, as notícias eram confusas: "Pensa-se que os assassinos foram recrutados pelos republicanos e os terroristas não estão ligados a esta conjura", transmitiu o correspondente do Russkoe Slovo.
"Pensa-se que um dos assassinos é francês e outro espanhol", informava a Agência de Informação de Petersburgo.
"Quem assassinou o Rei de Portugal?" – perguntava o Russkoe Slovo a 08 de Fevereiro, e respondia citando Guerra Junqueiro: "na conjura não participou o Partido Republicano, mas os chamados exaltados, que não obedecem à disciplina do Partido Republicano e vão mais longe nas tendências revolucionárias".
Vladimir Lenine, futuro dirigente da União Soviética, escreveu sobre o regicídio no artigo: "Sobre o que aconteceu ao rei português", publicado no jornal Proletarii de 19 de Fevereiro de 1908.
"A imprensa burguesa, mesmo a mais liberal e democrática, não pode passar sem a moral da extrema-direita ao abordar o assassinato do aventureiro português", escreveu Lenine, acrescentando que "...o sucedido com o rei português é verdadeiramente "um desastre profissional" dos reis".
"Nós, da nossa parte, acrescentamos apenas que só podemos lamentar uma coisa: que o movimento republicano em Portugal não tenha, decidida e abertamente, dado cabo de todos os aventureiros. Lamentamos que no sucedido com o rei português seja ainda evidente o elemento de conjura, isto é, de terror que, na sua essência, não alcança os objectivos, sendo fraco o terror verdadeiro, popular, realmente renovador, que tornou famosa a Grande Revolução Francesa", continua Lenine.
Segundo ele, "até agora, em Portugal conseguiu-se apenas amedrontar a monarquia com o assassinato dos dois monarcas, mas não exterminar a monarquia".
Publicado a 28 de Janeiro de 2008 pela Agência Lusa.
Nova Portugalidade
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