sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

APESAR DE TUDO, CONTINUA A DETRAÇÃO CONTRA A MONARQUIA

Dona Isabel I do Brasil, 
pela Graça de Deus e unânime Aclamação dos povos (de jure) Imperatriz do Brasil.

Artigo do site www.catolicismo.com.br

O Papa Leão XIII resolveu premiar a Princesa Isabel com a maior distinção que os Soberanos Pontífices davam a chefes de Estado e a pessoas de grande relevo, nas ocasiões em que adquiriam méritos especiais. Enviou-lhe a Rosa de Ouro, que foi entregue a 28 de setembro de 1888, no 17o aniversário da promulgação da Lei do Ventre Livre. A data foi escolhida pelo próprio Núncio Apostólico, para a cerimônia que se realizou com toda magnificência na capela imperial. Entretanto, apesar de tudo, continuou a campanha de detração contra a monarquia, agora dirigida especialmente contra o Imperador: o velho está gagá; ele dorme o tempo todo; o Conde d’Eu e a Princesa Isabel vão se tornar tiranos aqui. Uma série de calúnias foi espalhada por todo o País.

A 15 de novembro, os militares que estavam no Rio de Janeiro — eram minoria, representavam um terço do Exército brasileiro — proclamaram a República. O golpe foi totalmente alheio à vontade do povo. Tanto que os republicanos embarcaram a Família Imperial rumo ao exílio, à noite, para que não houvesse reação popular. Na partida, a Princesa Isabel passando junto à mesa onde havia assinado a Lei Áurea, bateu nela o punho fechado e disse: “Mil tronos houvera, mil tronos eu sacrificaria para libertar a raça negra”.

D. Pedro II recusou 5 mil contos de réis — cerca de 4 toneladas e meia de ouro, uma fortuna — que lhe ofereceram os revoltosos, porque, dizia, o novo governo não tinha direito de dispor assim dos bens nacionais. Da. Teresa Cristina, mal chegando a Portugal, morreu de desgosto no Grande Hotel do Porto. Eu lá estive há alguns anos, quando o hotel inaugurou uma placa em memória dela. D. Pedro II faleceu a 4 de dezembro de 1891, no Hotel Bedfor, em Paris, onde uma placa recorda o passamento do ilustre hóspede. Tal era o prestígio que cercava sua pessoa, que a República francesa concedeu-lhe funerais completos de Chefe de Estado.

Uma rainha, uma fada com a bondade brasileira

Conde d’Eu possuía um castelo na Normandia, mas ele e a Princesa Isabel compraram um palacete em Boulogne-sur-Seine, que é um nobre bairro periférico de Paris. Lá ela abria seus salões para os brasileiros que iam visitá-los. E não só isso. Conseguiu se impor na sociedade parisiense a tal ponto, que várias memórias de personalidades da época a apresentam quase como uma rainha daquela sociedade. Era tida mesmo como a principal personagem. Somente ela e o presidente da República podiam entrar de carruagem no pátio interno da Ópera de Paris.

Uma hindu, que se tornaria mais tarde Maharani de Karputhala, escreve em suas memórias que ela via a Princesa Isabel como uma verdadeira rainha, uma fada. Não só isso — rainha e fada — mas também com toda a bondade brasileira e católica, característica da Princesa Isabel. A Maharani narra que, quando menina, de passagem pela capital francesa, teve uma crise aguda de apendicite. Operada com os recursos incipientes da época, passou longa convalescença no hospital. A sociedade parisiense toda, curiosa, ia visitá-la. Ela dizia que se sentia um bichinho exótico, que as pessoas iam vê-la como num zoológico. E a única que foi visitá-la com bondade e para lhe fazer bem foi a Princesa Isabel. Ela conta que minha bisavó aproximou-se do seu leito, agradou-a muito, acariciou-a e consolou-a. E no fim, disse: “Minha filha, eu não sei que religião você tem. Mas sei que há um Deus que ama todas as crianças do mundo. Aqui está uma imagem da mãe d’Ele. Guarde-a consigo, e quando você estiver numa grande aflição, peça a Ela para interceder junto ao seu Filho”. Infelizmente a Maharani não se converteu à Igreja Católica, permaneceu pagã até o fim da vida, mas nos momentos de apuro ajoelhava-se diante da imagem de Nossa Senhora, que a Princesa Isabel tinha lhe dado. Porque sabia que seria atendida.

Santos Dumont, testemunha da bondade da Princesa

Santos Dumont, nessa época, realizava suas experiências em Paris. Sabendo que ele passava muito tempo no campo onde fazia seus experimentos, a princesa mandava-lhe farnéis a fim de que ele não precisasse voltar à cidade para almoçar. Certa vez, escreveu-lhe: “Sr. Santos Dumont, envio-lhe uma medalha de São Bento, que protege contra acidentes. Aceite-a e use-a na corrente de seu relógio, na sua carteira ou no seu pescoço. Ofereço-a pensando em sua boa mãe, e pedindo a Deus que o socorra sempre e ajude a trabalhar para a glória de nossa Pátria. Isabel, Condessa d’Eu”. Santos Dumont usou a medalha por toda a vida. E noutra ocasião disse-lhe: “Suas evoluções aéreas fazem-me recordar nossos grandes pássaros do Brasil. Oxalá possa o Sr. tirar de seu propulsor o partido que aqueles tiram de suas próprias asas, e triunfar para a glória de nossa querida Pátria”.

Muito tocante também é o fim da carta que ela escreveu ao Diretório Monárquico para anunciar os casamentos de seus filhos mais velhos. O Diretório era composto pelo Conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira, pelo Visconde de Ouro Preto e pelo Conselheiro Lafayette de Oliveira. A carta é datada de 9 de setembro de 1908: “Minhas forças não são o que eram, mas o meu coração é o mesmo para amar a minha Pátria e todos aqueles que lhe são dedicados. Toda a minha amizade e confiança”. Era o jeito brasileiro, a bondade brasileira perfeitamente encarnada naquela nobre dama.

Mesmo longe do Brasil, tudo fazia para engrandecer o País

Outra amostra de seu profundo interesse pelo Brasil está registrada numa carta ao Cons. João Alfredo. O Banco do Brasil –– não me recordo em que mandato presidencial ocorreu o fato –– estava num descalabro republicano: desordem total, contas que não estavam acertadas, funcionalismo completamente rebelde. E o presidente da República de então concluiu que o único que teria inteligência, força, garra e pulso para pôr ordem naquela situação seria o Cons. João Alfredo, e o convidou a assumir a presidência do Banco do Brasil. João Alfredo respondeu: “Eu sou monarquista, e portanto só posso aceitar esse cargo se a minha Imperatriz autorizar”. Escreveu à Princesa Isabel, explicando o caso. E ela respondeu-lhe: “Para o bem de nossa Pátria, o Sr. deve aceitar”. João Alfredo assumiu a presidência do Banco do Brasil, pôs em ordem o funcionalismo e acertou a contabilidade. Pagou todos os atrasados, todas as dívidas, deixando tudo em perfeito estado. Depois pediu demissão e morreu pobre, pois não recebeu nada por aquela importante gestão.

Em carta à irmã de um monarquista eleito deputado, Ricardo Gumbleton, de tradicional família paulista, o qual não queria aceitar o cargo de deputado, a Princesa observa: “Não concordo, absolutamente! Diga a seu irmão que ele deve aceitar a cadeira de deputado e propugnar pela grandeza moral, econômica e social de nossa Pátria. Não aceitando é que ele estará procedendo de maneira contrária aos interesses da coletividade. Não nos deve importar o regime político sob o qual esteja o Brasil, mas sim conseguir-se colaboradores de boa vontade capazes de elevar o nosso País. De homens como ele é que o Brasil precisa para ascender mais, para fortalecer-se mais. Faça-lhe sentir que reprovo sua recusa”. Esse fato revela uma vez mais que ela procurava colocar o bem do Brasil acima dos próprios interesses.

Na França, representou o que havia de melhor do Brasil

Ela ainda viveu até 1921. Cada vez mais fraca, mas conservando sempre aquela grande classe, aquele grande porte que a caracterizava. Em suas fotografias no exílio, ela mantém um porte imperial que não apresentava aqui no Brasil. No infortúnio, a noção da sua missão foi se cristalizando cada vez mais. E realmente, nessas fotografias, sua atitude era de uma imperatriz. No batizado de meu pai, ela manifesta uma nobreza e uma categoria impressionantes. E foi assim até o fim da vida.

Morreu sem poder voltar ao Brasil. Representou na França o que havia de melhor do Brasil. Muito mais do que nosso corpo diplomático, muito mais do que nossos homens de negócio, ela foi um exemplo do que o Brasil era ou deveria ser. E a França entendeu isso. Assis Chateaubriand escreveu, em Juiz de Fora, a 28 de julho de 1934: “Apagada a sua estrela política, depois de vencida a tormenta da abolição, ela não tinha expressão dura, uma palavra amarga para julgar um fato ou um homem do Brasil. No mais secreto de seu coração, só lhe encontrávamos a indulgência e a bondade. Este espírito de conduta, esse desprendimento das paixões em que se viu envolvida, era a maior prova de fidelidade, no exílio, à pátria distante. Mais de 30 anos de separação forçada não macularam a alvura dessa tradição de tolerância, de anistia aos agravos do passado, que ela herdara do trono paterno. [...] Foi no exílio que ela deu toda a medida da majestade e da magnanimidade do seu coração. [...] Ela viveu no desterro [...] como a afirmação de Pátria, acima dos partidos e dos regimes. Debaixo da sua meiguice, da sua adorável simplicidade, quanta fortaleza de caráter, quanto heroísmo, quantas obras valorosas”.

Faleceu no castelo d’Eu. Apagou-se suave e docemente. A República reconheceu o que o Brasil tinha perdido. O presidente Epitácio Pessoa determinou três dias de luto nacional, e que fossem celebradas exéquias de Chefe de Estado. Também a Câmara Federal votou que seu corpo fosse trazido para o Brasil num vaso de guerra, o que só se realizou em 1953. Em 13 de maio de 1971, seu corpo e o do Conde d’Eu foram transladados solenemente à catedral de Petrópolis, e lá repousam à espera da ressurreição dos mortos e do Juízo final.

Essa foi a insigne mulher que nosso Brasil registra em sua história. Ela não foi uma intelectual. Foi princesa e patriota até o fundo da alma. Uma senhora que tinha consciência de ter nascido para o bem de um País. E encarnou essa missão na Pátria e no exílio até o fim de sua existência. Foi um modelo de princesa, de imperatriz e de católica. Ela foi o tipo perfeito de grande dama brasileira.

FONTES:
  1. Hermes Vieira, Princesa Isabel – Uma Vida de Luzes e de Sombras, Editora Novos Ensaios Brasileiros, São Paulo, 1989;
  2. Hermes Vieira, op. cit., pp. 163 e 164, citando Heitor Lyra;
  3. O Culto a Isabel, “Diário de São Paulo”, 29-7-1934, citado na obra acima indicada de Hermes Vieira, pp. 232-233.

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