Dona Isabel I do Brasil,
pela Graça de Deus e unânime Aclamação dos povos (de jure) Imperatriz do Brasil.
Artigo do site www.catolicismo.com.br
O Papa Leão XIII resolveu premiar a Princesa Isabel com a maior distinção que os Soberanos Pontífices davam a chefes de Estado e a pessoas de grande relevo, nas ocasiões em que adquiriam méritos especiais. Enviou-lhe a Rosa de Ouro, que foi entregue a 28 de setembro de 1888, no 17o aniversário da promulgação da Lei do Ventre Livre. A data foi escolhida pelo próprio Núncio Apostólico, para a cerimônia que se realizou com toda magnificência na capela imperial. Entretanto, apesar de tudo, continuou a campanha de detração contra a monarquia, agora dirigida especialmente contra o Imperador: o velho está gagá; ele dorme o tempo todo; o Conde d’Eu e a Princesa Isabel vão se tornar tiranos aqui. Uma série de calúnias foi espalhada por todo o País.
A 15 de novembro, os militares que estavam no Rio de Janeiro — eram minoria, representavam um terço do Exército brasileiro — proclamaram a República. O golpe foi totalmente alheio à vontade do povo. Tanto que os republicanos embarcaram a Família Imperial rumo ao exílio, à noite, para que não houvesse reação popular. Na partida, a Princesa Isabel passando junto à mesa onde havia assinado a Lei Áurea, bateu nela o punho fechado e disse: “Mil tronos houvera, mil tronos eu sacrificaria para libertar a raça negra”.
D. Pedro II recusou 5 mil contos de réis — cerca de 4 toneladas e meia de ouro, uma fortuna — que lhe ofereceram os revoltosos, porque, dizia, o novo governo não tinha direito de dispor assim dos bens nacionais. Da. Teresa Cristina, mal chegando a Portugal, morreu de desgosto no Grande Hotel do Porto. Eu lá estive há alguns anos, quando o hotel inaugurou uma placa em memória dela. D. Pedro II faleceu a 4 de dezembro de 1891, no Hotel Bedfor, em Paris, onde uma placa recorda o passamento do ilustre hóspede. Tal era o prestígio que cercava sua pessoa, que a República francesa concedeu-lhe funerais completos de Chefe de Estado.
Uma rainha, uma fada com a bondade brasileira
Uma hindu, que se tornaria mais tarde Maharani de Karputhala, escreve em suas memórias que ela via a Princesa Isabel como uma verdadeira rainha, uma fada. Não só isso — rainha e fada — mas também com toda a bondade brasileira e católica, característica da Princesa Isabel. A Maharani narra que, quando menina, de passagem pela capital francesa, teve uma crise aguda de apendicite. Operada com os recursos incipientes da época, passou longa convalescença no hospital. A sociedade parisiense toda, curiosa, ia visitá-la. Ela dizia que se sentia um bichinho exótico, que as pessoas iam vê-la como num zoológico. E a única que foi visitá-la com bondade e para lhe fazer bem foi a Princesa Isabel. Ela conta que minha bisavó aproximou-se do seu leito, agradou-a muito, acariciou-a e consolou-a. E no fim, disse: “Minha filha, eu não sei que religião você tem. Mas sei que há um Deus que ama todas as crianças do mundo. Aqui está uma imagem da mãe d’Ele. Guarde-a consigo, e quando você estiver numa grande aflição, peça a Ela para interceder junto ao seu Filho”. Infelizmente a Maharani não se converteu à Igreja Católica, permaneceu pagã até o fim da vida, mas nos momentos de apuro ajoelhava-se diante da imagem de Nossa Senhora, que a Princesa Isabel tinha lhe dado. Porque sabia que seria atendida.
Santos Dumont, testemunha da bondade da Princesa
Muito tocante também é o fim da carta que ela escreveu ao Diretório Monárquico para anunciar os casamentos de seus filhos mais velhos. O Diretório era composto pelo Conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira, pelo Visconde de Ouro Preto e pelo Conselheiro Lafayette de Oliveira. A carta é datada de 9 de setembro de 1908: “Minhas forças não são o que eram, mas o meu coração é o mesmo para amar a minha Pátria e todos aqueles que lhe são dedicados. Toda a minha amizade e confiança”. Era o jeito brasileiro, a bondade brasileira perfeitamente encarnada naquela nobre dama.
Mesmo longe do Brasil, tudo fazia para engrandecer o País
Em carta à irmã de um monarquista eleito deputado, Ricardo Gumbleton, de tradicional família paulista, o qual não queria aceitar o cargo de deputado, a Princesa observa: “Não concordo, absolutamente! Diga a seu irmão que ele deve aceitar a cadeira de deputado e propugnar pela grandeza moral, econômica e social de nossa Pátria. Não aceitando é que ele estará procedendo de maneira contrária aos interesses da coletividade. Não nos deve importar o regime político sob o qual esteja o Brasil, mas sim conseguir-se colaboradores de boa vontade capazes de elevar o nosso País. De homens como ele é que o Brasil precisa para ascender mais, para fortalecer-se mais. Faça-lhe sentir que reprovo sua recusa”. Esse fato revela uma vez mais que ela procurava colocar o bem do Brasil acima dos próprios interesses.
Na França, representou o que havia de melhor do Brasil
Ela ainda viveu até 1921. Cada vez mais fraca, mas conservando sempre aquela grande classe, aquele grande porte que a caracterizava. Em suas fotografias no exílio, ela mantém um porte imperial que não apresentava aqui no Brasil. No infortúnio, a noção da sua missão foi se cristalizando cada vez mais. E realmente, nessas fotografias, sua atitude era de uma imperatriz. No batizado de meu pai, ela manifesta uma nobreza e uma categoria impressionantes. E foi assim até o fim da vida.
Morreu sem poder voltar ao Brasil. Representou na França o que havia de melhor do Brasil. Muito mais do que nosso corpo diplomático, muito mais do que nossos homens de negócio, ela foi um exemplo do que o Brasil era ou deveria ser. E a França entendeu isso. Assis Chateaubriand escreveu, em Juiz de Fora, a 28 de julho de 1934: “Apagada a sua estrela política, depois de vencida a tormenta da abolição, ela não tinha expressão dura, uma palavra amarga para julgar um fato ou um homem do Brasil. No mais secreto de seu coração, só lhe encontrávamos a indulgência e a bondade. Este espírito de conduta, esse desprendimento das paixões em que se viu envolvida, era a maior prova de fidelidade, no exílio, à pátria distante. Mais de 30 anos de separação forçada não macularam a alvura dessa tradição de tolerância, de anistia aos agravos do passado, que ela herdara do trono paterno. [...] Foi no exílio que ela deu toda a medida da majestade e da magnanimidade do seu coração. [...] Ela viveu no desterro [...] como a afirmação de Pátria, acima dos partidos e dos regimes. Debaixo da sua meiguice, da sua adorável simplicidade, quanta fortaleza de caráter, quanto heroísmo, quantas obras valorosas”.
Faleceu no castelo d’Eu. Apagou-se suave e docemente. A República reconheceu o que o Brasil tinha perdido. O presidente Epitácio Pessoa determinou três dias de luto nacional, e que fossem celebradas exéquias de Chefe de Estado. Também a Câmara Federal votou que seu corpo fosse trazido para o Brasil num vaso de guerra, o que só se realizou em 1953. Em 13 de maio de 1971, seu corpo e o do Conde d’Eu foram transladados solenemente à catedral de Petrópolis, e lá repousam à espera da ressurreição dos mortos e do Juízo final.
Essa foi a insigne mulher que nosso Brasil registra em sua história. Ela não foi uma intelectual. Foi princesa e patriota até o fundo da alma. Uma senhora que tinha consciência de ter nascido para o bem de um País. E encarnou essa missão na Pátria e no exílio até o fim de sua existência. Foi um modelo de princesa, de imperatriz e de católica. Ela foi o tipo perfeito de grande dama brasileira.
FONTES:
- Hermes Vieira, Princesa Isabel – Uma Vida de Luzes e de Sombras, Editora Novos Ensaios Brasileiros, São Paulo, 1989;
- Hermes Vieira, op. cit., pp. 163 e 164, citando Heitor Lyra;
- O Culto a Isabel, “Diário de São Paulo”, 29-7-1934, citado na obra acima indicada de Hermes Vieira, pp. 232-233.
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