quarta-feira, 27 de junho de 2018

NOSSO POVO NÃO É EDUCADO PARA ISSO

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"Nicolau, jovem e ingênuo, foi mal preparado pelo pai, que sempre evitou lhe dar responsabilidades. Sua irmã, Olga, fora muito clara quando falou do assunto: era tudo culpa do pai deles: "Ele nem mesmo deixava Nicolau sentar-se no Conselho de Estado antes de 1893."

Um ano mais tarde, o desnorteado tsarevich, que até o momento apreciava jogar bilhar no clube de oficiais, ir a teatros, óperas e visitar ciganas, viu-se proprietário de um vasto domínio familiar ancestral, com milhares de camponeses o chamando de "paizinho", e confiando a ele, suas vidas.

Só havia agora uma maneira de suportar o imenso e interminável dardo dos documentos oficiais, muitos deles tediosos, e absolutamente triviais, que se acumulavam com muita rapidez em sua mesa, já que ele dispensava uma secretária. Ele adotou uma rotina rigorosa. Tudo em sua vida diária era sistemático, desde a arrumação de suas canetas e lápis, e a forma de como escrevia suas cartas.

Sua calma [que as vezes era até interpretada como indiferença], não podia substituir a ausência de um comportamento típico de um monarca, ou o fato de que, sempre que se via em uma situação difícil ou de embate, ele era incapaz de ser severo com as pessoas em sua frente.

Indeciso, ele raramente agia de acordo com a opinião de alguém que não a de sua esposa [que ficava frustrada com a sua vacilação, o aconselhando a ser um verdadeiro autocrata], mas quando algo dava errado, ele jogava a culpa em cima de seus ministros, os demitindo.

Ele não tolerava perder o controle. Preferia a mediocridade profissional daqueles que não o desafiavam e falavam aquilo que ele queria escutar. Quando homens como o ministro Sergei Witte das finanças, e o primeiro-ministro, Pyotr Stolypin, davam orientações políticas decididas, sugerindo reformas socio-políticas, ele, fiel ao seu juramento à autocracia na sua coroação, e às "políticas de papai'', considerava tais atitudes uma usurpação de suas prerrogativas.

Ele particularmente se esquivava da companhia de modernizadores e representantes da cultura contemporânea, preferindo os rituais e etiquetas retrógradas daquilo que para ele era a segura velha ordem. As massas russas eram incapazes de lidar com qualquer outra forma de governo, e ele continuava acreditando que somente sua visão era a válida para o povo russo, disso Nicolau e Alexandra tinham certeza, e ninguém era mais eloquente do que ela ao expressar tal opinião: "Não somos um país constitucional, nem arriscaremos ser; nosso povo não é educado para isso."

Fonte: Os Últimos Dias dos Romanov, Helen Rappaport

TODAS AS VÍTIMAS ENTERRADAS JUNTAS

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"Uma vez que os ossos tivessem sido autenticados pelos cientistas, a decisão do governo russo seria quanto ao lugar para enterrá-los. Oficialmente, a decisão ficava ente duas cidades: Ekaterinburg, onde a família fora assassinada e os ossos encontrados, e São Petersburgo, onde por 300 anos os czares e imperatrizes Romanov foram enterrados.

Havia muitos fatores a considerar, inclusive questões de religião e de tradição, mas no fim a decisão recairia puramente no poder político.

O príncipe Nicolau Romanov, considerado chefe da família, até 2014, pelos opositores de Maria Vladmirovna [que defendia a separação dos corpos em covas importantes e menos importantes] insistiu apaixonadamente que os restos não fossem separados.

“Escrevi duas vezes ao patriarca. Falei com ministros do governo, e falei em público pela televisão russa: nós, Romanov, queremos que todos, todas as vítimas do massacre, sejam enterrados juntos, no mesmo lugar, na mesma catedral, e eu diria que no mesmo sepulcro.

 Querem enterrar o czar na Catedral Fortaleza de São Pedro e São Paulo? Ótimo! Então, enterrem o médico, a camareira e o cozinheiro lá também, no mausoléu do czar. Estiveram juntos por 73 anos. São os únicos que nunca traíram a família. Merecem ser honrados ao mesmo tempo, no mesmo lugar. Se os russos de hoje não entendem isso, mesmo se alguns Romanov forem ao funeral, eu não irei.”

O presidente da Rússia, Boris Yeltsin, também nasceu nos Urais, mas passou para um estágio mais amplo, onde sua frágil presidência precisava de todo apoio possível. Politicamente, o apoio de Anatoly Sobchak, prefeito de Petersburgo, é essencial para Yeltsin, e Sobchak está decidido a enterrar os restos em São Petersburgo.

A cerimônia, contudo, foi adiada várias vezes, e prorrogada por anos, pois enquanto os cientistas discutiam, a comissão ponderava, os líderes da Igreja exigiam mais provas e os emigrados disparavam acusações, os restos terrestres do último imperador russo, sua família, três de suas filhas e quatro fiéis servidores jaziam em mesas de metal numa salinha no segundo andar do necrotério de Ekaterinburg.

Finalmente, em 17 de julho de 1998, no 80° aniversário da execução, as ossadas de Nicolau, Alexandra, três irmãs, e os demais empregados [algo sem precedentes, já que aquele era o mausoléu imperial] foram enterrados na Catedral de São Pedro e Paulo."

Fonte: Os Romanov, o Fim da Dinastia, Robert K. Massie

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FUZILADOS SEM FORMALIDADES BURGUESAS

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"Durante esses anos, a Casa de Ipatiev, que foi construída durante os anos 1880, virou um museu da revolução, um museu antirreligioso, centro do Conselho da Sociedade Ateia, dos Arquivos Regionais do Partido e o escritório do reitor da Universidade Comunista Ural-Siberiana.

As paredes ostentavam fileiras de retratos de líderes bolcheviques e, se fossem nativos dos Urais, seus chapéus, casacos e medalhas ficavam expostos em vitrines. Cartazes e diagramas aclamavam as glórias do comunismo, mostrando que fora produzida uma quantidade muito maior de tratores, aviões, toneladas de aço e conjuntos de roupas de baixo nos tempos de Stalin do que nos do czar.

Um quarto no andar de cima foi dedicado aos Romanov, com excertos do diário de Nicolau, páginas do diário de Alexei e a primeira página de um jornal de Ekaterinburg com a manchete:

EXECUÇÃO DE NICOLAU, O ASSASSINO SANGUINÁRIO COROADO – FUZILADO SEM FORMALIDADES BURGUESAS, MAS CONFORME NOSSOS PRINCÍPIOS DEMOCRÁTICOS.

O porão não fazia parte do museu. Cheio de caixas velhas empilhadas até o teto, fora transformado em depósito.

Os visitantes da Casa de Ipatiev, forçosamente cidadãos soviéticos, viam os retratos, cartazes e diários, e saíam para se misturarem aos outros na Praça da Revanche do Povo. Não tinham simpatia pelos Romanov.

A família imperial era só uma parte da história, condenada, seus diários em vitrines de museu não eram mais relevantes. Mas o Partido e a KGB nunca esqueceram. Em 1977, o diretor da KGB Yuri Andropov convenceu o presidente Leonid Brezhnev de que a Casa de Ipatiev havia se tornado um local de peregrinação de monarquistas incógnitos.

Foi expedida uma ordem do Kremlin para o primeiro-secretário da Região de Sverdlovsk, um nativo siberiano chamado Boris Yeltsin, para destruir a casa no prazo de três dias. Na noite de 27 de julho de 1977, uma enorme bola de demolição pendurada num guindaste, acompanhado por escavadeiras, chegou à frente da casa. Pela manhã, o prédio estava reduzido a tijolos e pedras descarregados no lixão da cidade."

Os Romanov, o Fim da Dinastia

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EX-CZAR FUZILADO EM EKATERINBURG!

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"Desde o começo, o aniquilamento dos Romanov – a execução e o desaparecimento dos corpos – havia sido aprovado por Moscou. Até junho de 1918, as lideranças bolcheviques não sabiam bem o que fazer com a família imperial.

Já mantendo os prisioneiros em Ekaterinburg, o Soviete do Ural era veementemente a favor da execução. Leon Trotsky, o exacerbado comissário vermelho, queria um julgamento público do ex-czar em Moscou, com transmissão nacional de rádio, em que ele, Trotsky, seria o promotor. Lênin, sempre pragmático e cauteloso, preferiu manter a família como peões no jogo que sustentava com a Alemanha.

Em abril, a Rússia Soviética havia assinado o Tratado de Brest Litovsk com a Alemanha Imperial, negociando a paz em troca de um terço da Rússia Europeia e todo o ocidente da Ucrânia para ocupação alemã. Milhões de russos ficaram perplexos diante dessa decisão, que foi considerada uma traição.

Outra complicação, foi que a imperatriz Alexandra era alemã e prima-irmã do kaiser Wilhelm. Agora que a Rússia estava fora da guerra, o novo embaixador alemão em Moscou, conde Wilhelm Mirbach, deixou clara a preocupação de seu governo com relação à segurança de Alexandra e suas quatro filhas.

Lênin não tinha intenção de antagonizar os alemães, principalmente naquele momento. No começo de julho, a guerra civil e a intervenção estrangeira ameaçavam o domínio bolchevique na Rússia. Além dos alemães no oeste e no sul, fuzileiros navais norte-americanos e soldados britânicos haviam desembarcado no norte, em Murmansk. Na Ucrânia ocidental, os generais Alekseyev, Kornilov e Deniken haviam organizado um Exército Branco de voluntários.

Em meio a essa confusão, a ideia de um julgamento espetacular de Nicolau parecia sem sentido, irrelevante. Os próprios Romanov já pareciam meio supérfluos, quase um estorvo. Era melhor não arriscar para eles não caírem em mãos erradas.

Sverdlov relatou essa situação a seu amigo Filipp Goloschekin, membro do Soviete Regional do Ural. Assim, o último contou a seus companheiros do Soviete Regional do Ural que os Romanov não tinham mais utilidade para o governo e deixava a cargo do comitê decidir o momento e a maneira de dispor da família.

O Soviete do Ural votou imediatamente pela execução de todos. Comandante da Casa de Ipatiev, Yurovsky, recebeu ordens para fuzilar os prisioneiros e destruir todos os vestígios do que tinha acontecido.

O comunicado oficial redigido por Sverdlov e enviado para os jornais Pravda e Izvestia também omitiu o fato de que a esposa, as filhas e o filho de Nicolau haviam sido mortos junto com o czar. Em 20 de julho, apareceram jornais em Moscou e em São Petersburgo anunciando:

EX-CZAR FUZILADO EM EKATERINBURG! MORTE DE NICOLAU ROMANOV!

No mesmo dia, o Soviete do Ural pediu autorização para publicar: “O ex-czar e autocrata Nicolau Romanov foi fuzilado juntamente com sua família... Os corpos foram enterrados.” O Kremlin proibiu essa divulgação porque mencionava a execução da família.

Somente em 22 de julho, os editores de jornais de Ekaterinburg foram autorizados a publicar a versão manipulada por Moscou sobre o que acontecera na cidade."

Fonte: Os Romanov, o Fim da Dinastia, Robert K. Massie

O CÔMODO DO PORÃO ERA SINISTRO

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"Apenas oito dias após o massacre, Ekaterimburgo caiu sob o ataque do Exército Branco, e alguns oficiais correram à Casa de Ipatiev. O prédio estava praticamente vazio. Havia escovas de dentes, de cabelos, pentes, alfinetes e ícones pisoteados espalhados pelo chão.

Nos armários, pendiam cabides vazios. A Bíblia de Alexandra ainda estava lá, com passagens fortemente sublinhadas, flores e folhas secas entre as páginas. Também restavam vários livros religiosos, um volume de Guerra e Paz, três de Tchekhov, uma biografia de Pedro, o Grande, um volume de Contos de Shakespeare e Les Fables de la Fontaine.

Num dos quartos, encontraram uma mesinha de bordas arredondadas, onde o czarevich fazia as refeições e brincava com jogos na cama. Ao lado, um manual de instruções para tocar balalaica. Na sala de jantar, perto da lareira, estava a cadeira de rodas.

O cômodo no porão era sinistro. Ainda havia traços de sangue nos rodapés. O piso amarelo, rigorosamente lavado e escovado, apresentava marcas de balas e de baionetas. As paredes estavam laceradas por buracos de balas. Faltavam grandes partes do reboco da parede contra a qual a família fora enfileirada.

Uma busca imediata pela família não levou a lugar nenhum. Somente seis meses depois, em janeiro de 1919, teve início uma investigação minuciosa quando o almirante Alexander Kolchak, “Chefe Supremo” do Governo Branco da Sibéria, confiou a tarefa a um investigador jurídico profissional, de 36 anos, chamado Nicolai Sokolov.

Tão logo a neve começou a derreter, Sokolov iniciou o trabalho nos Quatro Irmãos. A trilha na floresta ainda apresentava os sulcos profundos das rodas das carroças e do caminhão. A terra em torno dos poços estava pisoteada, marcada por patas de cavalos.

Galhos cortados e queimados flutuavam no Poço de Ganin e na entrada estreita da outra mina. As paredes da mina mais profunda traziam evidências de explosões de granadas. Havia vestígios de duas fogueiras, uma na beira da entrada estreita da mina e outra no meio da estrada da floresta.

Para esse trabalho de reconhecimento, teve ajuda de dois tutores do czarevich: Pierre Gilliard, que dava aulas de francês, e Sidney Gibbes, professor de inglês. Ambos haviam permanecido em Ekaterinburg depois que a família imperial fora encerrada na casa.

Entre as evidências identificadas e catalogadas pelos homens desolados estava a fivela do cinto do czar, uma fivela militar de tamanho infantil que o czarevich usava, uma cruz de esmeralda, chamuscada, que a imperatriz viúva Maria tinha dado à imperatriz Alexandra, um brinco de pérola do par sempre usado por Alexandra, a Cruz de Ulm, o distintivo comemorativo adornado com safiras e diamantes presenteado à imperatriz pela própria Guarda de Uhlan de Sua Majestade, um estojinho de bolso de metal, em que Nicolau trazia sempre o retrato da esposa, três pequenos ícones das grã-duquesas, a caixa de óculos da imperatriz, seis conjuntos de corpetes femininos, fragmentos de bonés militares usados por Nicolau e seu filho, fivelas de sapatos pertencentes às grã-duquesas, os óculos do dr. Botkin e sua dentadura superior com catorze dentes.

Havia ainda alguns ossos calcinados, parcialmente destruídos por ácido e com marcas de machado, balas de revólver e um dedo humano, delgado e bem manicurado como os de Alexandra tinham sido. Sokolov recolheu também vários pregos, papel-alumínio, moedas de cobre e um pequeno cadeado, o que o deixou intrigado até mostrar essas peças a Gilliard.

O tutor imediatamente identificou-as como parte das quinquilharias que o czarevich carregava no bolso. Por fim, esmagado, mas não queimado, os investigadores encontraram o corpo decomposto do spaniel de Anastácia, Jemmy."

Fonte: Os Romanov, o Fim da Dinastia, Robert K. Massie

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COMO MATÁ-LOS?

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"Mas será que eles tomaram a decisão correta quanto ao modo de matar todos eles? O fato era que Yurovsky, embora fosse absolutamente impiedoso rumo ao comprimento de sua tarefa, não sabia qual seria a melhor opção de matar 11 pessoas, tampouco tinha certeza sobre a logística adequada para se livrar de tantos corpos.

Executar o czar era uma coisa, porém matar a família inteira e seus serventes, e ainda conseguir, como ordenado, manter segredo, era outra coisa completamente diferente. E depois, havia a pressão extra de garantir que nenhum rastro fosse encontrado pelos monarquistas, que se aproveitariam da ignorância dos mais devotos entre os camponeses, e usariam qualquer achado como "miraculosa relíquia sagrada" para angariar apoio contra os bolcheviques.

O método preferido de execução da polícia bolchevique, a Cheka, era levar as vítimas para a floresta, e atirar na parte de trás da cabeça delas. Outros sugeriram que, para se desfazer dos corpos, amarrassem-os com pesos de ferro e os jogassem no lago Iset.

Esse método podia funcionar quando era uma única vítima, mas levar outras 10 aterrorizadas para uma floresta escura, era impossível, e um camponês poderia aparecer por lá, mesmo num ponto tão remoto. Ele ainda teria que impedir o eventual estupro das garotas, ou a procura por joias.

As execuções teriam que ser dentro da casa, e sugeriram que a família fosse morta enquanto dormia. Outro, chegou a propor que trancassem as vítimas num quarto e jogassem granada. Mas isso seria muito barulhento, e a estrutura da casa poderia ser comprometida.

A única maneira viável era levá-los ao porão da casa, em um cômodo pequeno, onde não poderiam fugir, e o som dos disparos seria abafado pelo som do motor de um caminhão ligado, de madrugada, enquanto a maioria das pessoas estivesse dormindo. Em um outro quarto, que ficava perto, sempre havia um guarda com uma metralhadora.

A única fuga possível seria pela linha de tiro. De lá, os corpos teriam de ser destruídos com ácido e fogo nas clareiras escolhidas por esse propósito. Enquanto o plano lúgubre era finalizado, na manhã de 16 de julho, Olga ajudava a mãe a organizar "nossos remédios".

Este era o código para costurar as joias delas nos roupas, indicação de que, por conta da situação instável em Ekatarimburgo, elas imaginavam serem transferidas de novo, e queriam ter certeza que as joias mais preciosas não fossem entregues a Yurovsky.

Cordões de pérolas, safiras, rubis e diamantes continuaram bem escondidos. O resto da família foi dar o curto passeio habitual no jardim. O último de suas vidas."

Fonte: Os Últimos Dias dos Romanov, Helen Rappaport

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A INDÚSTRIA E O TRABALHADOR

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"Os primeiros sinais de industrialização na Rússia apareceram mesmo [tardiamente, visto que outras regiões, como a Inglaterra, começaram sua industrialização por volta de 1780] sob Nicolau I [bisavô de Nicolau II], quando uma linha ferroviária foi concluída de São Petersburgo a Moscou, em 1851.

Era uma realização de prestígio, mas era ao mesmo tempo, um início sucinto. A Rússia era grande e a construção ferroviária nunca adquiriu totalmente o impulso que proporcionaria ao país uma rede suficientemente densa [mesmo que, por volta de 1876, tivesse crescido muito consideravelmente].

Além do transporte de mercadorias ou de passageiros, isso era necessário para o movimento rápido das tropas, como foi feito mais uma vez evidente em 1914 [já havia sido aparente durante a Guerra da Criméia]. Nos primeiros dias da Primeira Guerra Mundial, a Alemanha moveu seus soldados rapidamente o suficiente para evitar ofensas russas ao longo da frente oriental.

Mais de sessenta anos após a conclusão da primeira linha ferroviária substancial, o desenvolvimento das ferrovias russas estava longe de ser equivalente do inimigo alemão.

Além da construção ferroviária, a industrialização russa precoce ocorreu principalmente em matéria têxtil. Mesmo nos últimos anos da servidão, surgiram brocas têxteis que não eram diferentes da Manchester ou Glasgow na Grã-Bretanha. Eles foram fundados em Moscou, São Petersburgo e Ivanovo-Voznesensk no centro da Rússia, bem como na Polônia.

A força de trabalho consistia grandemente de ex-camponeses que já antes da introdução de um processo de produção mecanizada tinha vindo a ganhar renda suplementar tecendo em casa, e pagando aos seus senhores.

Mas os períodos reais de decolagem para a industrialização russa foram as décadas de 1880-90. Financiado por iniciativa privada [incluindo a de alguns estrangeiros], empréstimos estrangeiros e tributação comparativamente alta, especialmente daqueles que menos podiam pagar, o campesinato e, em parte, cobrando em bens de consumo como na vodka.

O governo forneceu infra-estrutura necessária e ativamente iniciou várias empresas, por exemplo, na mineração na Sibéria. Também levantou fundos exportando recursos, como cereais. Os ministros das finanças da época [entre os quais Sergei Witte merece um lugar de honra] que orientaram essa política econômica, tentando assim copiar o caminho alemão bem sucedido para a industrialização de meados do século XIX.

A construção da Transiberiana, de 9289 quilômetros, conectando Moscou ao Mar do Japão, foi chefiada grandemente por Witte na década de 1890. Portos-chave ligados às ferrovias como os de Odessa, Riga e Novorossiisk apresentaram um movimentado fluxo de navios, assim como melhores infraestruturais em seu redor.

A produção de carvão, ferro e petróleo continuaram crescendo na década de 1890 na Bacia Donets. A produção perto de Baku, no Azerbaijão, quase triplicou durante a mesma década. Principais cidades nessas regiões em expansão, como Baku ou Ekaterinoslav, viram suas populações duplicarem em dez anos.

Ainda assim, grande parte do império não foi tocado pelas mudanças, pois a indústria tendia a estar fortemente concentrada em algumas áreas.

Em 1900, todavia, quase três vezes mais pessoas trabalhavam como artesãs [fazendo produtos em pequena escala sem ferramentas mecanizadas] do que como trabalhadores industriais: oito a nove milhões eram artesãos e artesãos, quando aproximadamente três milhões encontraram emprego em fábricas e minas.

A maioria das novas fábricas estabelecidas nas últimas décadas do século XIX eram grandes, empregando milhares de trabalhadores. Os seus salários eram baixos [parcialmente porque os trabalhadores realizavam trabalho predominantemente não qualificado] e as condições de trabalho eram duras.

Entretanto, o governo respondeu a pior exploração dos trabalhadores pela legislação. Os marcos da legislação incluíram a proibição do trabalho infantil em 1882 [para crianças com menos do que doze anos]; a limitação da jornada de trabalho até um máximo de onze horas e meia por dia em 1897; e o decreto de 1903 que obrigava os empregadores a compensar os feridos no trabalho em suas empresas.

Os sindicatos, porém, eram proibidos, e as greves proibidas, também. Acidentes eram comuns, com centenas de trabalhadores morrendo em toda a Rússia todos os anos em acidentes industriais e ferroviários."

Fonte: The history of Russia and it's Empire, Kees Boterbloem

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SE NÃO HOUVESSE HEMOFILIA, NÃO TERIA HAVIDO LÊNIN

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"É impossível traçar com exatidão o curso de uma das mais esmagadoras influências desse drama: o gene recessivo que a rainha Vitória passou a seus descendentes. Até recentemente, quando o plasma e fortes concentrados de plasma se tornaram acessíveis, a hemofilia, como outras doenças hereditárias recessivas, tendiam a se extinguir nas famílias afetadas, pelo processo de atrito.

No enorme clã da rainha Vitória, esse padrão foi seguido. Na quarta geração – os bisnetos da rainha – houve seis hemofílicos. Alexei foi um deles. Dois outros foram o príncipe Alfonso das Astúrias e o príncipe Gonzalo, filhos de Alfonso XIII, rei da Espanha.

Ambos morreram em acidentes de carro: Alfonso na Áustria, em 1934, e Gonzalo em Miami, em 1938. Nos dois casos, não fosse a hemorragia incontrolável, não houve ferimentos graves.

A quinta geração da família da rainha Vitória, que inclui tanto a rainha Elizabeth quanto seu marido, o príncipe Philip, está livre da hemofilia, bem como a sexta geração. É possível que o gene mutante ainda exista em estado latente entre as descendentes da rainha Vitória, e possa surgir de repente num menino no futuro.

Mas com o passar das sucessivas gerações essa possibilidade, já distante, se tornará extremamente remota. Kerensky disse: “Se não houvesse Rasputin, não teria havido Lênin.” Se isso é verdade, é também verdade que, se não houvesse hemofilia, não teria havido Rasputin. Isso não quer dizer que tudo o que aconteceu na Rússia e no mundo consequentemente, teve origem unicamente na tragédia pessoal de um único menino.

Não é para subestimar o atraso e a insatisfação da sociedade russa, o clamor por reformas, a tensão e o desgaste de uma guerra mundial, a natureza gentil e retraída do último czar, e a histeria da impopular imperatriz. Tudo isso teve um impacto muito forte, contundente, sobre os acontecimentos. Mesmo antes do nascimento do czarevich, a autocracia já estava em retrocesso."

Fonte: Nicolau e Alexandra, Robert K. Massie

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Веселого Рождества [VESELOGO ROZHDESTVA; FELIZ NATAL]

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A tradição de instalar e decorar um Ёлка [pinheiro] para o Natal remonta ao século XVII, quando Pedro, o Grande, importou a prática como resultado de suas viagens a Europa. Pedro decretou em 1700, que o Ano Novo seria celebrado em 1º de janeiro ao invés de em 1° de setembro e, que "ramos e árvores de abeto, pinheiros e juníperos serão usados ​​para decorar casas e portas nas ruas principais". Após a morte de Pedro, a prática foi esquecida.

Não era um costume até a década de 1840, montar árvores na Rússia. O costume passaria a ser importado pelos alemães. No final dessa década, começaram a vender árvores de natal em Gostiny Dvor, centro comercial de St. Petersburgo. A primeira árvore de Natal pública foi organizada em 1852 no prédio da Estação Ekateringofsky, também na capital imperial.

Provavelmente por iniciativa da imperatriz Alexandra Fedorovna, esposa de Nicolau I, e bisavó do último czar, de origem prussiana, uma árvore de Natal foi instalada, nas câmaras pessoais da família imperial. A árvore poderia ser montada no Palácio de Inverno, em Gatchina, no caso de Alexandre III, ou em Tsarskoe Selo, no caso de Nicolau II.

Sob a doutrina marxista da União Soviética, as celebrações de Natal - juntamente com outras festas religiosas - foram proibidas como resultado da campanha ateísta. Todavia, em 1935, as celebrações e decorações natalinas, que eram celebradas não em 24 de dezembro, mas em 6 de janeiro, conforme o antigo calendário juliano [utilizado na Rússia imperial], foram transferidas para as comemorações do Ano Novo, que, no período imperial, eram comemorados em 14 de janeiro, por conta do calendário, mas com as mudanças vindas da revolução, o calendário, agora gregoriano, se ajustou em 1° de janeiro.

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UM CASAMENTO IMPERIAL

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"Entre padres e litanias, ruas decoradas em negro, rostos tristes, lágrimas e torcer de mãos, Alexandra reprimia sua pequena, patética felicidade. “Pode-se bem imaginar os sentimentos”, ela escreveu à irmã.

“Um dia no mais profundo luto, lamentando um ser querido, no dia seguinte nas mais luxuosas roupas, me casando. Não pode haver maior contraste, mas nos tornou mais unidos, se é que isso é possível.” “Assim foi minha entrada na Rússia”, ela acrescentou mais tarde.

“Nosso casamento me pareceu a mera continuação das missas para o falecido, com a diferença de que então usei um vestido branco, em vez de preto.” O casamento aconteceu em 26 de novembro de 1894, uma semana após o enterro do imperador Alexandre.

O dia escolhido foi o do 47° aniversário da imperatriz viúva Maria, e para essa ocasião o protocolo permitia um breve alívio do luto. Vestidas de branco, Alexandra e Maria foram juntas na carruagem, do Nevsky Prospect até o Palácio de Inverno.

Diante de um famoso espelho de ouro usado por todas as grã-duquesas russas no dia do casamento, a noiva foi formalmente vestida pelas damas da família imperial. Ela usou um pesado vestido antigo da corte russa, de brocado de prata, com manto e cauda de ouro debruado com arminho, junto com o tradicional colar e os brincos de diamantes nupciais.

Maria retirou pessoalmente a refulgente coroa nupcial de diamantes da almofada de veludo e colocou-a delicadamente sobre a cabeça de Alexandra. Juntas, atravessaram as galerias do palácio até a capela, onde Nicolau esperava, vestindo o uniforme dos hussardos e botas.

Cada um segurando uma vela acesa, Nicolau e Alexandra se postaram diante do arcebispo. Minutos antes da uma da tarde, eram marido e mulher. Alexandra estava radiante. “Ela estava tão maravilhosamente linda”, comentou a princesa de Gales.

George, duque de York, escreveu a Mary, na Inglaterra: “Acho que Nicky é um homem de muita sorte para ter uma esposa tão bela e charmosa, e devo dizer que nunca vi duas pessoas mais apaixonadas e mais felizes do que eles. Disse a ambos que não poderia lhes desejar mais do que serem tão felizes quanto você e eu somos juntos. Estou certo?”

Devido ao luto, não houve recepção depois da cerimônia, nem lua de mel. O jovem casal retornou imediatamente ao Palácio Anitchkov. “Quando saíram do Palácio de Inverno, após o casamento, receberam uma tremenda... ovação da enorme multidão nas ruas”, George escreveu à rainha Vitória.

“Os aplausos foram muito calorosos e me lembraram a Inglaterra... Nicky tem sido a bondade em pessoa para mim, é o mesmo menino querido de sempre e conversa abertamente comigo sobre todos os assuntos... Faz tudo com tanta calma e naturalidade; todos se admiram com isso e ele já é muito popular.”

No Palácio Anitchkov, Maria esperava para recebê-los com o tradicional pão e sal. Passaram lá a noite, responderam a telegramas de congratulações, jantaram às oito e, segundo Nicolau, foram “dormir cedo, porque Alix estava com dor de cabeça”.

O casamento iniciado naquele dia foi perfeito pelo resto da vida deles. Foi um casamento vitoriano, externamente sereno e convencional, mas baseado num amor físico intenso e passional. Na noite do casamento, antes de ir dormir, Alexandra escreveu no diário do marido:

“Finalmente unidos, ligados para toda a vida, e quando esta vida acabar, nos encontraremos no outro mundo e ficaremos juntos pela eternidade. Sua, sua.” Na manhã seguinte, transpassada por novas emoções, ela escreveu: “Jamais acreditei que pudesse haver tão absoluta felicidade nesse mundo, tamanho sentimento de unidade entre dois mortais. Eu amo você, essas três palavras têm nelas a minha vida.” "

Fonte: Nicolau e Alexandra, Robert K. Massie

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COM TODA PROBABILIDADE SERÃO FUZILADOS

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"No dia 17 de maio, o bando mais intimidador até então de Guardas Vermelhos chegou à Casa do Governador, dessa vez de Ekaterimburgo, liderado por um homem chamado Rodiónov. Eram “os facínoras mais assustadores, sujos, esfarrapados, bêbados” que Gleb Bótkin [filho do médico da família] já vira.

Frio e desconfiado por natureza, Rodiónov vivia à procura de conspirações: ele ordenou uma humilhante chamada diária e as meninas tinham de lhe pedir permissão para descer e sair no pátio. Tinham ordens de manter a porta do quarto aberta à noite, assim, ouviam todo o tipo de obscenidades vindas dos guardas, na maioria, bêbados, que também faziam gestos e desenhos impróprios.

Quando um padre e as freiras chegaram no dia seguinte para conduzir as vésperas, postou uma sentinela ao lado do altar para observá-los durante a cerimônia. Kobilínski ficou chocado: “Isso oprimiu tanto todo mundo, teve tal efeito neles, que Olga Nikoláevna chorou e disse que se soubesse que isso aconteceria, nunca teria pedido a cerimônia”.

Alexei continuava extremamente frágil e mal conseguia sentar por mais do que uma hora seguida. Não obstante, três dias depois de chegar, Rodiónov decidiu que o menino estava bem o bastante para viajar. Por vários dias então a criadagem fizera os preparativos para a partida deles.

“Os quartos estão vazios, pouco a pouco todas as malas foram feitas. As paredes parecem vazias sem os retratos”, escreveu Alexei para sua mãe. Qualquer coisa que não fosse junto teria de ser “descartada” na cidade — se não tivesse sido pilhada pelos guardas antes [como eles tentaram fazer com os braceletes de ouro das meninas].

A maior parte da comitiva se preparou para partir com as crianças. A filha do dr. Bótkin, Tatiana, pediu que ela e o irmão recebessem permissão de ir com as três irmãs, mas isso lhes foi negado. “Por que uma garota bonita como você ia querer apodrecer a vida toda na prisão, ou mesmo ser fuzilada?”, escarneceu Rodiónov. “Com toda aprobabilidade serão fuzilados.”

Ele foi igualmente insensível quando contou a Aleksandra Tégleva sobre o que o futuro reservava: “A vida por lá é bem diferente”. Um dia antes da partida das crianças para Ekaterimburgo, Bótkin foi à Casa do Governador para tentar vê-las uma última vez.

Ele avistou Anastácia numa janela; ela acenou e sorriu, ao que Rodiónov veio correndo para lhe dizer que ninguém tinha permissão de olhar pelas janelas e que os guardas iriam atirar para matar se alguém tentasse fazê-lo. "

Fonte: As Irmãs Romanov, Helen Rappaport

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EM UM ESTALO DE DEDOS


"O Manifesto Imperial de 30 de outubro de 1905 transformou a Rússia de uma autocracia absoluta em uma monarquia semiconstitucional. Prometia ao povo russo “liberdade de consciência, expressão, assembleia e associação”.

Garantia um parlamento eleito, a Duma, e que “nenhuma lei entraria em vigor sem o consentimento da Duma”. Não ia tão longe quanto a monarquia constitucional da Inglaterra; o czar mantinha suas prerrogativas de decisão sobre assuntos externos e de defesa, e o poder total de nomear e demitir ministros.

Mas o manifesto fez a Rússia voar, com grande rapidez, por cima de um difícil terreno político que a Europa ocidental levou séculos para atravessar. Witte agora se metera numa situação complicada. Tendo forçado um soberano relutante a autorizar uma Constituição, esperava-se que ele a fizesse funcionar.

Para desespero de Witte, ao invés de melhorar, a situação piorou. A direita o odiava por ter degradado a autocracia, os liberais não confiavam nele e a esquerda temia que a revolução esperada lhes escapasse das mãos.

Assim, irromperam pogroms contra os bodes expiatórios de sempre, os judeus, e outras minorias, e, vendo o manifesto como fraqueza, manifestações por independência irromperam pelo país, assim como violência pelas greves gerais, inspiradas pelos bolcheviques, e pela limitação dos poderes da polícia.

Enquanto isso, Nicolau esperava impaciente que seu experimento com o constitucionalismo desse resultados. À medida que Witte tropeçava, ele se tornava mais amargo. Antes de outubro de 1905, não havia partidos políticos na Rússia além do Social Democrata e do Revolucionário Socialista, ambos revolucionários e agindo na clandestinidade.

Nessas circunstâncias, era notável que dois partidos liberais sérios surgissem subitamente: o Constitucional Democrata, ou Cadete, liderado pelo historiador Paulo Miliukov, e o Outubrista, assim batizado por sua adesão ao manifesto de outubro de 1905, liderado por Alexandre Guchkov.

Entretanto, o abismo de entendimento entre monarquia e parlamento era grande demais. A Duma foi recebida pelo czar na sala do trono do Palácio de Inverno. Não foi uma ocasião promissora. Montes de policiais e soldados mantiveram-se de prontidão na praça defronte ao palácio.

Os deputados recém-eleitos, com trajes simples, permaneceram de um lado do salão, olhando fixamente para o enorme trono de ouro e carmesim, encarando a imperatriz e suas damas em vestidos formais da corte. Do outro lado, estavam a corte e os ministros, dentre eles o conde Fredericks.

“Os deputados”, ele disse, “dão a impressão de uma gangue à espera de um sinal para se atirarem sobre os ministros e lhes cortarem a garganta. Que rostos perversos! Eu nunca mais porei os pés no meio dessa gentalha.”

Os 524 membros mal haviam tomado seus lugares no salão do Palácio Tauride quando formularam um agressivo e devastador “Discurso ao Trono”. Para horror de Nicolau, exigiam sufrágio universal, reforma agrária radical, libertação de todos os prisioneiros políticos e demissão de todos os ministros nomeados pelo czar em favor de ministros aceitáveis pela Duma.

A um comando de Nicolau, os pedidos foram rejeitados. Estupefato com a cena de revolta, Nicolau estava mais do que decidido a acabar com a Duma, e, dias depois, as portas do Palácio Tauride foram fechadas e publicaram um decreto imperial dissolvendo a Duma.

Muito a contragosto, Nicolau abandonou seu plano de eliminar a Duma, pois sabia que isso significaria mais tumulto, e deu permissão para a eleição de um segundo parlamento."

Fonte: Nicolau e Alexandra, Robert K. Massie

A MORTE DE DOIS AMANTES

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"Por um momento, o corpo do tsar ficou estrebuchando no chão, com os olhos fixos e arregalados, as cavidades toráxicas, expostas pelos buracos das balas, espumando sangue oxigenado, coração acelerado, tudo em uma tentativa de bombear sangue para o seu corpo repleto de traumas.

Logo depois, ficou paralisado no chão. Ele foi o felizardo, já que foi poupado de ver o que aconteceu à mulher que amara incondicionalmente durante mais de 25 anos de sua vida, e claro, sua família.

Ermakov disparou sua Mauser contra a tsarina, que estava apenas a dois metros dele, enquanto ela tentava fazer o sinal da cruz, atingindo-a no lado esquerdo do crânio, o que fez com que pedaços de seu cérebro voassem para todos os lados, ao mesmo tempo em que uma rajada de balas atingiam o torso dela.

Alexandra entrou em colapso no chão, com sangue quente e pegajoso e pedaços de cérebro espalhados em volta, em meio a uma névoa de fumaça. Ao lado dela, estava o tsarevich, que presenciou tudo, incrédulo, junto das irmãs histéricas, que nem mesmo conseguia se levantar para correr, com seu rosto extremamente pálido, todo respingado de sangue do pai.

Quando tudo estava acabado, e depois de pilharem os corpos, desfigurados e horrendos, com feridas medonhas na cabeça e cabelos emplastados com sangue coagulado - impossível de associar com as vistosas crianças das propagandas oficiais do tsarismo, um dos homens disse que conseguiu pôr a mão dentro da saia do cadáver da imperatriz, e apalpar sua genitália, dizendo que agora "poderia morrer em paz".

Para a surpresa de todos, no corpo da imperatriz haviam fileiras de pérolas grandes, suas jóias prediletas, escondidas dentro do cinto em volta de sua cintura, e cordões de ouro na parte superior de seu braço.

Cada criança tinha em volta do pescoço um amuleto que continha a foto de Rasputin, e o texto de uma oração. Era difícil resistir à tentação de se apoderar de um ou outro souvenir, mas o olho de águia de Yurovsky estava atento, fazendo um inventário dos quase 8 quilogramas de jóias colhidas."

Fonte: Os Últimos Dias dos Romanov, Helen Rappaport

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O FUTURO NO HORIZONTE

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"Em 1906, três quartos do povo russo extraíam do solo sua sobrevivência. Desde quando Alexandre II aboliu a servidão, a maioria dos camponeses russos vivia em aldeias comunais, fazendo planos comunais para as terras e trabalhavam em parcerias.

O sistema era ridiculamente ineficaz. Dentro de cada comuna, um único camponês podia cultivar até 50 faixas de terra compridas e dispersas, com magras fileiras de trigo ou de centeio em cada faixa. O camponês passava mais tempo percorrendo os sulcos espalhados da plantação do que arando a terra e semeando os grãos.

Pyortr Stolypin, o primeiro-ministro, reverteu esse sistema comunal e introduziu o conceito de propriedade privada. Por decreto do governo, ele declarou que todo camponês que desejasse poderia se desligar da comuna e exigir dela uma parte da terra para cultivar para si mesmo.

E deveria ser um pedaço de terra único, não espalhado em tiras, e essa terra seria herdada pelos filhos daquele camponês. Nicolau aprovou totalmente o programa de Stolypin e, a fim de disponibilizar mais terras, propôs que 4 milhões de acres da Coroa fossem vendidos ao governo, que, por sua vez, as venderia aos camponeses em condições acessíveis.

Embora o czar precisasse do consentimento da família imperial para dar esse passo, e apesar da oposição do grão-duque Vladimir e da imperatriz viúva, ele acabou conseguindo. As terras foram vendidas e Nicolau esperava que os nobres seguissem seu exemplo.

Mas nenhum deles o fez. O impacto da lei de Stolypin foi tanto político quanto econômico. De um só golpe, ele criou uma classe de milhões de pequenos proprietários, cujo futuro estava atrelado a um clima de estabilidade que só podia ser mantido pelo governo imperial.

Aconteceu que os camponeses mais vociferantes e perturbadores da ordem foram os primeiros a reclamar as terras e a se tornarem adeptos da lei e da ordem, diminuindo o movimento revolucionário. Em 1914, nove milhões de famílias de camponeses russos tinham fazendas próprias. No fundo, o sucesso ou fracasso político da Rússia dependia das colheitas.

De 1906 a 1911, o país foi abençoado com verões quentes, invernos amenos e boas colheitas. Em cada acre, os grãos foram os melhores da história da Rússia. Com a fartura de alimentos, o governo subiu os impostos. O orçamento ficou equilibrado e houve até superávit.

Com os grandes empréstimos da França, a rede ferroviária se expandiu rapidamente. Minas de carvão e de ferro bateram recordes de produção. Empresas norte-americanas, como a International Harvester e a Singer Sewing Machine Company, estabeleceram filiais no país.

Na Duma, o governo propôs e passou leis aumentando os salários dos professores primários e estabelecendo o princípio do ensino fundamental gratuito. A censura à imprensa foi amenizada e o governo se tornou mais liberal quanto a tolerância religiosa."

Fonte: Nicolau e Alexandra, Robert K. Massie

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COROAÇÃO DO CZAR ALEXANDRE II

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Em 7 de setembro de 1856, após a desastrosa Guerra da Criméia, o imperador Alexandre II da Rússia era coroado na Catedral da Assunção, ao lado de sua esposa, a imperatriz Maria Alexandrovna, originalmente princesa de Hesse-Darmstadt.

Reinariam até o assassinato de Alexandre em 1881, e, além da Rússia se expandir em seu reinado, o tsar foi responsável por várias outras reformas, incluindo a abolição da servidão, a reorganização do sistema judicial e educacional, a modernização da marinha, a abolição do castigo corporal, promoção do autogoverno provincial através dos zemstvos, imposição do serviço militar universal, e o fim de alguns privilégios da nobreza.

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terça-feira, 19 de junho de 2018

A RÚSSIA ANTES DO COMUNISMO

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"[...] a Rússia, que ocupava 1/6 da superfície terrestre, gozara de um período notável de crescimento que testemunhara a transformação de São Petersburgo em uma das 6 maiores cidades da Europa. A economia continuava baseada na agricultura, o alicerce de sua enorme riqueza sendo a produção de cereais, mas agora, a era uma das líderes na produção mundial.

Os territórios ocidentais do Império compreendiam uma indústria próspera de ferro e aço, e ainda por serem exploradas, reservas naturais na Ásia Central e na Sibéria que estavam sendo desbravadas por uma vasta rede ferroviária, ligada também aos valiosos campos petrolíferos.

A Rússia no exterior, em outrora vista como asiática e atrasada, era finalmente percebida como "lucrativo terreno para investimento". No exterior, muito se falava também sobre o crescente poderio militar da Rússia Imperial, que seria testado a partir de 1914. O exército mobilizado consistia em 4 milhões de soldados, e sua marinha, projetava-se entre a terceira e a quinta maior do mundo.

Mas não era apenas no poderio militar que estava traçando um perfil internacional para si: o país usufruía de uma explosão artística. Na música, com Stravinsky e Rachmáninov, nas pinturas de Malevitch, Kandínski e Chagall, nos balés de Diáguilev, e uma vibrante poesia dominada por Aleksandr Blok, Andrei Béli e Anna Akhmátova.

Mas a fim de assegurar maior desenvolvimento, o país ainda carecia de um elemento crucial: um sistema político estável, e um governo constitucional adequado que consolidasse as liberdades do povo. Desde 1906, a Duma avançava aos solavancos, de uma crise para a seguinte, de forma cada vez mais debilitante, sendo 3x dissolvida e depois re-estabelecida.

A 4ª Duma, de 1912, fora ainda mais disfuncional, e o estado de espírito político naquele ano de 1913 foi "antagônico", numa contínua reação contra as medidas repressivas pós 1905. Muitos achavam que havia pouco a comemorar. O tricentenário da dinastia trouxera uma montanha de concessões, inclusive anistias e reduções de sentenças para prisioneiros, [...]"

Fonte: As Irmãs Romanov, Helen Rappaport

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sábado, 16 de junho de 2018

IMUNDÍCIE MONARQUISTA

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"Lênin nunca se apressava quando se tratava de tomar uma decisão, ele era uma máquina de pensar, fria e cínica, com uma mente sofisticada e flexível. Ele adorava colocar seus inimigos uns contra os outros. Enquanto os Romanov fossem úteis a algum propósito político, seriam mantidos vivos.

[...] ele chegou a esperar que fosse possível usá-los para barganhar com os alemães, quem sabe até reduzindo a dívida [...] contraída no Tratado de Brest-Litovsk. Mas com o soviete dos Urais e outros linhas duras continuando a bombardeá-lo com telegramas que exigiam a execução do tsar, ele sabia que o tempo estava contra ele.

"Aniquilação": uma palavra tão desprovida de emoção e sem sentido. Primeiro, foi usada para se referir à aniquilação das instituições tsaristas, da propriedade privada, da ortodoxia e dos demais costumes e hábitos antigos.

Depois se tornou um eufemismo empregado quando se referiam a reprimir seus oponentes. Agora, seu significado estava ampliado para cobrir uma "limpeza social" (clérigos, aristocratas, burocratas e etc, tinham de ser extirpados).

[Mas] Lênin queria ter certeza que seu nome não seria manchado pelo assassinato deles. O que é evidente é que o enigmático Sverdlov, o homem que realmente comandava a máquina do partido, foi quem moveu-se para selar o destino da família em conversas com os bolcheviques dos Urais.

Mas isso não exclui o fato de que para Lênin, a dinastia Romanov "era uma imundície monarquista", e que para a revolução e a "limpeza social", [...], "centenas de cabeças Romanov tinham de ser cortadas."

No fim, foi o argumento de que os tchecos estavam avançando que fez este ato de oportunismo político ser sancionado.

Não era uma questão de impedir que os Romanov caíssem nas mãos inimigas, mas uma resposta à pressão dos já decadentes alemães: se o tsar caísse nas mãos dos contra-revolucionários, e se tornasse motivo de manifestações anti-alemãs na Rússia, o tratado de paz, e com eles os sustentáculos do governo soviético, estariam arruinados.

E ainda havia uma complicação. Eles decidiram matar o tsar, mas a política estrangeira do país afirmava ser essencial manter a aniquilação do resto da família como segredo até então. Era uma questão de conveniência matá-los.

O quê os uralianos fariam depois com as mulheres e o menino naquela situação onde todos queriam colocar as mãos neles? E, seria muito ruim em termos políticos que o governo fosse visto como responsável pelas mortes de mulheres e crianças inocentes."

POST ORIGINAL: Romanov: A Última Dinastia da Rússia