quinta-feira, 14 de julho de 2016

Carta Aberta a Lincoln de Abreu Penna


Prezado jornalista Ancelmo Góis.

Se por um lado não se pode ignorar a mão estendida de uma pessoa, como o descendente de Floriano Peixoto intenciona, por outro não se pode deixar passar os sofismas contidos em sua carta aberta a Dom João. A defesa que faz, tanto de seu ancestral como do regime republicano, é por demais frágil para que se deixe as coisas como estão, e merece a resposta, que deveria ocupar o mesmo espaço na sua coluna.

Caro Prof. Lincoln Peixoto de Abreu Penna.

É surpreendente a sua carta publicada hoje, 10.7.2016 na coluna do Góis, evidentemente em reação a outra matéria recente veiculada pelo próprio Ancelmo, citando as convicções democráticas e monarquistas do D. João de Orleans e Bragança.

O Sr. inicia o seu texto demonstrando incômodo com a onda de intolerância, da mesma forma que muitos o tem feito na mídia ultimamente, principalmente aqueles que sentem abaladas as suas convicções políticas pelo desenrolar dos acontecimentos no Brasil nos últimos anos. Nunca é demais lembrar contudo, que só pode ser saudada a intolerância que a maioria dos brasileiros tem demonstrado em relação à corrupção, às mentiras e à irresponsabilidade dos nossos dirigentes, daqueles que pretensamente nos representam, assim como os eleitores que insistem em defender esses malfeitores. Isso é diferente da tolerância que se deve cultivar para garantir a convivência pacífica entre pessoas e grupos honestos que se diferenciam pela cultura, religião , etnia, filosofias e
até orientação sexual.

Foi com satisfação que li em sua carta a opinião a respeito da necessidade de se "reformar em profundidade o sistema de representação política". Imagino porém que, não abrindo mão de suas convicções, como diz, o Sr. deseja o apoio dos monarquistas para a realização de uma profunda reforma política, desde que esta não resulte na volta do regime parlamentar com um monarca na Chefia de Estado, que é o que estava dando certo por aqui principalmente durante o segundo
reinado.

O Sr. faria melhor se reconhecesse a tragédia a que o seu ancestral conduziu o país. Acredito que Floriano Peixoto, ao contrário de Deodoro, tenha se envolvido com a quartelada de novembro de 1889 levado por um sincero ideal positivista, pregado na Escola Militar naquela época. Acontece que o positivismo não tinha nada de democrático. Ao contrário, defendia abertamente uma ditadura de elite. Não deve ser fácil para o Sr. conviver com a com a noção de ser descendente de um ditador
dos mais sanguinários. Lamento. Por acaso a população brasileira foi consultada antes de se derrubar a monarquia? Não era natural se contar com uma reação armada? Deve ser lembrada como uma vergonhosa mancha na nossa história a matança da guerra civil no sul, desencadeada pelos golpistas de 1889. O que dizer dos enforcamentos e fuzilamentos de jovens cadetes em Anhatomirim? E o que dizer do genocídio de Canudos?

O Império acabou com a escravidão e a república tenta fazer o contrário. Quando que na república houve "incremento de iniciativas democráticas? Em 128 anos tivemos ditaduras, estados de sítio, política café com leite, suicídio de presidente, renúncia de outro, e impeachments. Que mais ainda
querem? Rui Barbosa, republicano de primeira hora, em 1914 já chamara a atenção de que "se no Império o parlamento era uma escola de estadistas,na república virou um balcão de negócios". De lá para cá, parece que a coisa só piorou. Vamos então sim proceder a uma profunda reforma política, e por que não voltar ao que já deu certo?

Atenciosamente,
Bruno Hellmuth
médico no Rio de Janeiro.

LINK ORIGINAL: CMRJ - https://goo.gl/YROHC2

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