Publicado em 04/07/2016 às 11h01
PARATY (RJ) _ Nem o príncipe herdeiro da família imperial brasileira escapou da crise. Este ano, por falta de grana, ele teve que cancelar a tradicional recepção que costuma oferecer em sua casa aos escritores convidados para a Flip (Festa Literária Internacional de Paraty), mas isso não o impediu de oferecer um almoço, na sexta-feira, a pequeno grupo de amigos, nem arrefeceu seu entusiasmo com o Brasil retratado pelo príncipe-fotógrafo em 12 livros.
Quando recebi o convite, logo pensei em fazer uma entrevista com ele, pois não o conhecia. Queria saber o que pensa o bisneto da princesa Isabel e trineto de Dom Pedro II sobre uma possível volta da monarquia, caso seja convocado, como já andam pedindo, um novo plebiscito sobre o sistema de governo (o último, em que venceu o presidencialismo, foi realizado em 1993). Até fiquei com receio de parecer impertinente, diante da gravidade da situação em que vivemos.
Aos 62 anos, com seu jeitão de surfista veterano, o empresário Dom João Henrique Maria Gabriel Gonzaga de Orléans e Bragança ou, simplesmente, Dom Joãozinho, como é chamado pelo povo de Paraty, veio nos receber no jardim do casarão colonial à beira-mar, e logo espantou meus temores. Sem frescuras nem salamaleques, fomos para a ampla sala de visitas e eu fui direto ao assunto: o que ele acharia da ideia de virar rei do Brasil e assumir o trono?, já que corre este risco, nunca se sabe.
Pois, ao contrário do que eu imaginava, ele não só não me mandou embora como gostou do assunto. "O Brasil vem antes de tudo", foi logo proclamando, sem fugir da raia. "Não sei se você sabe, mas Dom Pedro II morreu pobre. Era tão obcecado pelo Brasil que, quando foi mandado para o exílio após a Proclamação da República, enviou uma carta desejando sucesso ao novo governo e recusando a pensão que queriam lhe pagar. Dom Pedro agradeceu, e explicou que não poderia receber dinheiro do Brasil sem estar servindo ao Brasil"
Homem culto de hábitos simples, sem nenhuma arrogância imperial, como muitos dos nossos políticos, João oferece uma cachaça de fabricação própria, a "Maré Alta" (muito boa), e se empolga ao falar do último imperador do Brasil. "Minha formação vem daí. Dom Pedro II era um exemplo do que um homem público tem que ser. A família imperial está pronta a servir o Brasil".
Apesar das origens reais, o príncipe se define como republicano à moda das monarquias parlamentaristas europeias, com ideias progressistas, antenado com seu tempo. Com um discurso pronto, caso seja chamado a se manifestar sobre os rumos nacionais, promete "respeito às ideologias, à pluralidade política, à imprensa livre e à democracia".
O almoço já está servido, mas, antes de fazer seu prato, João quer falar mais um pouco. "Acredito na necessidade de se fazer uma reforma política e defendo o voto distrital. Hoje, com tantos partidos, está havendo muita roubalheira". E ele sabe do que está falando: desde que fez sua primeira viagem ao Xingu, em 1978, não parou mais de viajar pelo Brasil, com dois objetivos: retratar a realidade do nosso País e defender o meio ambiente.
À mesa de dez lugares, nenhum banquete, apenas um almoço frugal: salada de folhas e arroz de frutos do mar. Para beber, vinho branco chileno e água com hortelã. Os tempos são difíceis até para um príncipe, mas Dom Joãozinho se despede com cara de quem está de bem com a vida.
Diante da pobreza de lideranças políticas que temos por aqui, com o fracasso dos sucessivos sistemas de governo testados na República, dos primeiros marechais até chegarmos a esse falido presidencialismo de coalização (ou de cooptação), talvez não seja má ideia pensarmos de novo na monarquia. Por que não? Um bom candidato a rei nós já temos...
LINK ORIGINAL: R7 - http://noticias.r7.com/blogs/ricardo-kotscho/minha-primeira-flip-a-crise-e-o-principe-dom-joao/2016/07/04/
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