Lord Thomas Cochrane. Marquês do Maranhão
Lord Thomas Cochrane, após fundar a Marinha chilena e garantir a independência do país em uma audaciosa ação naval na costa do Pacífico, foi convidado por Dom Pedro I, em 1823, a comandar a nova Marinha brasileira, sob a patente de “primeiro-almirante”, recebendo duas vezes mais do que no Chile. Com o uso de subterfúgios e enganações, a sua marca registrada, ele proveu inestimável apoio naval para as vitórias brasileiras na Bahia, em Pernambuco, Pará e Maranhão. Suas ações asseguraram os sucessos brasileiros no Nordeste e no Norte, sendo nomeado marquês do Maranhão pelo imperador logo em seguida. Quando retornou a Portsmouth, em 1825, em uma fragata brasileira, deu-se a primeira saudação formal à Bandeira do Brasil em terras europeias. A fama do lorde britânico, entretanto, não é das melhores em terras brasileiras, e em especial no Maranhão.
O ex-senador José Sarney (PMDB-AP), em uma visita oficial a Londres, à época em que era presidente do Brasil, foi à Abadia de Westminster, onde Lord Cochrane está enterrado. Diz-se que o mesmo ali exclamou: “Corsário! Piso, e piso com gosto (em sua tumba)! É um sujeito o qual só merece o meu desprezo e asco”. Sarney estava, parcialmente, correto. Lord Cochrane foi um nobre escocês sem muitas posses, ávido por recompensas. Ele teria escrito ao seu irmão, em sua chegada ao Chile: “Tenho a perspectiva de fazer a maior fortuna que pode ser feita no nosso tempo, salvo a do Duque de Wellington”. Naquele tempo, ser recompensado em dinheiro era uma prática aceita pela Marinha britânica. Mas a busca por dinheiro iria manchar a reputação do lorde.
Cochrane foi um famoso capitão de fragata da Marinha Real durante as Guerras Napoleônicas. Foi chamado pelos franceses de “lobo do mar”. O seu pai foi um inventor e investidor escocês fracassado, deixando as economias da família em um estado crítico. O tio de Cochrane, capitão de fragata, auxiliou o seu ingresso na Marinha. Com as conquistas, vieram os inimigos, que as transformavam em recriminações e decepções. Eleito membro do Parlamento britânico, defendeu as suas causas radicalmente e criticou duramente a corrupção e a incompetência na Marinha. No entanto, a ele sempre faltaram tato e diplomacia.
Envolveu-se em um grande escândalo na Bolsa de Valores, em 1814. Alegou inocência, mas mesmo assim, foi preso e expulso da Marinha Real e da Ordem do Banho pelo príncipe regente. As suas campanhas no Chile e no Brasil, e depois na Grécia, renderam-lhe uma espécie de reabilitação. Cochrane só retornou à Marinha britânica em 1832, promovido ao posto de contra-almirante. A ele foi dado o comando das frotas da América do Norte e do Caribe em 1848, tendo a sua bandeira de almirante abaixada em 1851, quando tinha 75 anos.
Lord Cochrane, então conde de Dundonald, prosseguiu com as suas inovações e os seus experimentos, dentre eles a aplicação de motores a vapor para navios de combate (ele levou ao Pacífico o primeiro navio a vapor). Também buscou aplicar na Marinha britânica o uso de gás venenoso. Somente em 1857 recebeu os salários atrasados de sua campanha no Brasil — um montante de 34 mil libras. E, a apenas um dia do seu funeral, em 1860, o seu título da Ordem do Banho foi restaurado na Abadia de Westminster, sob o comando da rainha Vitória e do príncipe Albert.
O atual governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), pouco simpático ao clã dos Sarney, publicou recentemente no Diário Oficial maranhense um decreto removendo os nomes de todos os “políticos vivos” das instituições educacionais do estado, dos quais sete prestavam homenagem ao ex-presidente e ex-governador do estado, José Sarney. Lord Cochrane é mais lembrado hoje literariamente do que pelo seu controverso legado histórico. C. S. Forester baseou-se nas campanhas de Cochrane para algumas de suas novelas. Patrick O’Brian fez o mesmo. O filme “Mestre dos mares”, com Russell Crowe também baseia-se em Cochrane. O ex-presidente José Sarney, membro da Academia Brasileira Letras, assim como da Academia Maranhense, e romancista, entenderá a ironia.
Kenneth Maxwell é historiador
LINK ORIGINAL: oglobo.globo.com/opiniao/o-marques-do-maranhao-18695951#ixzz40xRYnjNl
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