quinta-feira, 14 de abril de 2016

Centralização de poder e ruptura da República

Dom Luiz Philippe de Orleáns e Bragança

17 de agosto de 2015, 07:30

Para muitos brasileiros a retirada do atual governo executivo parece ser a resolução adequada de vários problemas estruturais que o Brasil enfrenta. Depois de varias manifestações e uma marcha heroica de jovens pelo impeachment, será que esses objetivos estão alinhados com o que o Brasil precisa?

Poucos tem a consciência de que o problema maior não é a falta de ética e legitimidade do atual governo mas sim o fator que tornou esse governo tão relevante: centralismo de poder federal. Por quê isso é relevante neste momento?

Há somente dois fatores históricos fundamentais que, são comprovadamente forças causadoras de aspectos negativos em nossa evolução como país: o primeiro é nossa escolha recorrente por modelos de governo centralizadores e o segundo é a nossa dependência do Estado Federal como provedor de bem estar social.

No século 19, a primeira constituição brasileira limitava o poder de D. Pedro I, mas era explicita em centralizar o poder político e econômico na capital do Império. Ao final do século 19 o modelo centralizado já se demonstrava inadequado para atender as necessidades básicas das diversas localidades do Império.

Para corrigir isso, a primeira constituição republicana tentou por decreto conclamar o Brasil como uma federação de estados membros autônomos e limitar os poderes da união. No entanto seu efeito não durou muito, logo no inicio do século 20 essa constituição já falhara com seu intento inicial e o poder político e econômico voltou a ser centralizado nas mãos das oligarquias.

Varias outras constituições brasileiras subsequentes declararam o Brasil como federativo mas todas também falharam neste quesito. Na atual constituição de 1988 o resultado não foi diferente. Na Constituição de 1988, foi nítido o seu intento federalista, e até mesmo municipalista, mas por ironia ela tornou possível a centralização no poder federal de maneira nunca antes vista.

Ao se auto-intitular “Cidadã”, esta Constituição auferiu ao Estado Federal a defesa de vários direitos individuais. Para um governo populista como o atual, bastou uma leitura desviada da carta magna de 1988 para justificar poderes federais ilimitados e passar a sugar ainda mais recursos dos contribuintes.

Em função desta centralização, nos quase 130 anos de República um ciclo reruptura constitucional se formou com reincidência alarmante: o que gerou a criação de outras constituições – 6 constituições até agora. Neste ciclo um governo oligárquico centraliza o poder, altera leis e emendas para manter benefícios e afasta forças oposicionistas do dialogo político.

Essas forças alienadas alimentam a formação de um governo rival, invariavelmente populista. Uma vez no poder, o governo populista também viola a constituição para extrair benefícios e se manter no poder. Em nenhum momento de nossa historia republicana surgiram lideres republicanos com desejo de descentralizar fortalecendo a independência de instituições e reforçar a autonomia dos estados membros. Por quê? A resposta curta está no “é necessário para controlar do poder político”.

Com o poder político fragmentado entre os estados membros fica mais difícil de controlar a nação com um todo. É esse desejo de controle total do estado que é o elo comum de populistas e oligarcas. Ambos precisam de governo centralizado para poder controlá-lo.
Este ciclo de alternância de poder entre oligarquias e populistas só será rompido quando houver descentralização efetiva do poder político e econômico.

Países federativos como Canadá, Suíça, Alemanha e Estados Unidos denotam governos livres deste ciclo negativo desde sua formação (desde o pós-guerra no caso da Alemanha). Nestes países, forças políticas de oligarcas e populistas permanecem fragmentadas por isso não criam raízes fortes o bastante para romper a ordem constitucional da federação.

Se o Brasil fosse de fato um pais federativo, com o poder da União limitado e os estados membros mais autônomos e representativos, pode-se dizer que o Brasil não estaria vivendo tamanha instabilidade estrutural, a beira de mais uma ruptura constitucional. Também pode-se dizer que com estados membros retendo a maior parte dos tributos em seu território e no comando de alocação de seus recursos, o governo local seria mais representativo. Com isso boa parte das frustrações básicas dos contribuintes nas ultimas manifestações rua estariam mitigadas.

Portanto, mais do que remover uma presidente incompetente é necessário federalizar de fato o sistema de governo tornando o custo do desgoverno do poder central inócuo.

A criação de uma República Federativa de fato, com poderes federais limitados, instituições e estados membros independentes, com praticas transparentes e políticos representativos do contribuinte não surge naturalmente. Requerem ativismo focado, profundo e constante. Para aqueles movimentos de rua que acabaram de acordar para esta perspectiva, um novo objetivo está lançado.

Luiz Philippe de Orleans e Bragança é empresário, membro da família real brasileira e um dos fundadores do Movimento Acorda Brasil.

# Artigo publicado originalmente na coluna Opinião da Folha de São Paulo.

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