S.M. o Imperador Dom Pedro II do Brasil
A Constituição Imperial de 1824 tornou o Brasil um país unitário visando facilitar o controle do governo central sobre as províncias e assim impedir um eventual desmembramento territorial. Contudo, tratava-se na realidade de um semi-unitarismo, pois haviam assembleias municipais eleitas pela população com suas próprias prerrogativas. Tal quadro viria a se modificar com a promulgação do Ato Adicional em 1834 que criou Assembleias Provinciais, que poderiam legislar sobre temas relacionados à administração local. O Ato também criou o "governo econômico e municipal", que possibilitaria às cidades "neutralizarem de certa forma o poder exercido nas Províncias pelos seus Presidentes".
Mesmo depois da revisão ocorrida em 1840, o Estado brasileiro permaneceu com características básicas do federalismo, apesar deste não ter existido em sua plena concepção. Ocorre que devido ao fato do federalismo ter sido a principal proposta de mudança defendida pelos republicanos do século XIX, causou aos estudiosos do tema a impressão de que ela não existiu durante o período monárquico. William Riker, um dos principais teóricos a respeito do federalismo, considerava que a monarquia brasileira havia adotado um modelo federativo após o Ato Adicional de 1834. Tal opinião advém do fato de que para existir o federalismo, seria necessária a "divisão de competências entre governo geral e governos regionais".
A principal característica da federação é a existência mútua de dois níveis autônomos de governo, nesse caso, central e regional. Isto já era realidade durante a monarquia, que seria considerada uma federação de fato, se não fosse o fato dos presidentes das Províncias serem nomeados e do Senado ser vitalício. O oficial prussiano Max von Versen que visitou o Brasil em 1867 escreveu que o Imperador "compartilha a soberania com o Senado e com a Câmara de Deputados, que são assembleias eleitas pelo sufrágio universal. De fato a Coroa não tem senão a competência de executar decisões do poder legislativo. É tão grande a autonomia administrativa das províncias, tão predominante as atribuições políticas do Parlamento quanto é pequena a esfera de atribuições políticas do Imperador".
A conclusão que se chega sobre o assunto, segundo Mirian Dohnikoff, é de que:
"A divisão constitucional de competências entre governos provinciais e governo central, garantindo autonomia dos primeiros, a qual não podia ser unilateralmente revogada pelo governo central; a capacidade de os governos provinciais tomarem decisões autonomamente sobre temas relativos à tributação, força policial, obras públicas, empregos, etc.; a constante negociação entre províncias e centro no parlamento para dirimir tensões e confrontos entre interpretações divergentes sobre a esfera de competência de cada um; a atribuição do governo central de responder pela unidade nacional, provido dos instrumentos necessários para tanto; e sua convivência com governos provinciais autônomos, que respondiam por questões regionais estratégicas, foram elementos federativos que prevaleceu no Brasil do século XIX. A derrota nas negociações das reformas em 1832, que resultou na manutenção da vitaliciedade do Senado, e o fato de ser o presidente de província nomeado pelo governo central impediram a adoção plena de um modelo federativo. Por outro lado, como procurei demonstrar, o presidente tinha poderes restritos, de sorte que ele não se constituía em obstáculo ao exercício da autonomia provincial. O presidente não tinha poder de apresentar projetos legislativos, e o direito de veto às leis aprovadas na Assembleia era apenas suspensivo. Deveria ser exercido em um prazo diminuto, apenas dez dias, e retornava para a mesma Assembleia que aprovara a lei, na qual poderia ser derrubado por dois terços dos deputados."
Assim, restava ao governo monárquico extinguir o Senado vitalício e permitir a escolha dos Presidentes das províncias através do voto popular, para se atingir um grau de federalismo completo. Tais mudanças viriam a ocorrer em 1889, quando o visconde de Ouro Preto, Presidente do último Conselho de Ministros da monarquia, apresentou suas propostas de governo à Assembleia Geral.
Mas devido ao golpe de Estado que instaurou a República, tais planos não puderam vir a tornar-se realidade.
FONTES:
- CARVALHO, José Murilo de. D. Pedro II. São Paulo: Companhia das Letras, 2007;
- DOLHNIKOFF, Miriam. Pacto imperial: origens do federalismo no Brasil do século XIX.São Paulo: Globo, 2005, p.287;
- GRIECCO, Donatello. Viva a República!. Rio de Janeiro: Record, 1989, p.21;
- DOLHNIKOFF, Miriam. Pacto imperial: origens do federalismo no Brasil do século XIX. São Paulo: Globo, 2005, p.291-292;
- VERSEN, Max von. História da Guerra do Paraguai. Belo Horizonte: Itatiaia, 1976, p.31.
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