quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

"O GRITO DO IMPIRANGA", DE MACHADO PARA O IMPERADOR

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"Só peço aos deuses, também creio nos deuses, que afaste do Brasil o sistema republicano"
Machado de Assis

Liberdade!... Farol divinizado! -
Sob o teu brilho a humanidade e os séculos
Caminham ao porvir. Roma as algemas
Quebrou dos filhos que a opressão lançara
Dentre a sombra de púrpura dos Césares,
Que envolvia Tarquínio em fogo e sangue,
Cheia de tua luz e estimulada
Por teu nome divino - essa palavra
Imensa como as vozes do Oceano.
Sublime como a ideia do infinito!
Tal como Roma a terra americana,
Um dia alevantando ao sol dos trópicos
A fronte que domina os estandartes,
Saudou teu nome majestoso e belo -
E o brado imenso - Independência ou morte! -
Soltado lá das margens do Ipiranga.
Foi nos campos soar da eternidade.

Desenrola nas turbas populares
Dos livres a bandeira o herói tão nobre,
Digno dos louros festivais que outrora
Roma dava aos heróis entre os aplausos
Do povo que os levava ao Capitólio!
Ele foi como o César de Marengo;
Sua voz como a lava do Vesúvio
Levada pela voz da imensidade
Foi do Tejo soar nas margens, onde
Estremeceu de susto o lusitano!

Ipiranga!... Ipiranga!... A voz das brisas
Este nome repete nas florestas!
Caminhante! Eis ali onde primeiro
Soou o brado - Independência ou morte! -
O homem secular levando as águias
Por entre os turbilhões de pó, de fumo,
Ostentando nos livres estandartes
O lúcido farol de um século ovante,
Mais sublime não foi nem mais valente
Que Pedro o herói, da América travando
Do farol da sagrada liberdade,
E acordando o Brasil, escravizado,
Sob férreos grilhões adormecido.

Somos livres! - Nas paginas da história
Nosso nome fulgura - ali traçado
Foi por Deus, que do herói guiando o braço,
Nas folhas o escreveu do eterno livro.
Somos livres! - No peito brasileiro
A ideia da opressão não se acalenta!
Somos já livres como a voz do oceano,
Somos grandes também como o infinito,
Como o nome de Pedro e dos Andradas!

Seja bendito o dia em que Colombo
César dos mares, afrontando as ondas,
À Europa revelou um Novo Mundo;
Ele nos trouxe o cetro das conquistas
Nas mãos de Pedro - o fundador do Império!

O herói calcando os pedestais da história,
Ergue soberbo aos séculos vindouros
A fronte majestosa! Imenso vulto!
É ele o sol da terra brasileira!
Neste dia de esplêndidas lembranças
No peito brasileiro se reflete
O nome dele - como um sol ardente
Brilha dourado no cristal dos prismas!

Tomando o sabre, dominou dois mundos
O herói libertador, valente e ousado!
Ele, o tronco da nossa liberdade,
Foi como o cedro secular do Líbano,
Que resiste ao tufão e às tempestades!

Ipiranga! Inda o vento das florestas
Que as noites tropicais respiram frescas
Parecem murmurar nos seus soluços
O brado imenso - Independência ou morte!
Qual o trovão nos ecos do infinito!

Disse ao guerreiro o Deus da Liberdade:
Liberta o teu Brasil num brado augusto,
E o herói valente libertou num grito!

Joaquim Maria Machado de Assis
7 de setembro de 1856.

Poema recentemente descoberto de Machado de Assis, publicado no dia 9 de setembro do ano de 1856, no jornal Correio Mercantil, quando o escritor tinha ainda 17 anos de idade.

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