sexta-feira, 17 de julho de 2015

DOM PEDRO I, O LIBERAL


A visão histórica ensinada nas escolas até os dias atuais é a de que um dom Pedro I autoritário e despótico teria entrado em conflito com a liberal e democrática assembleia, fechando esta última contra a vontade do povo brasileiro e acabando por outorgar (impôr) uma constituição de cunho absolutista sobre o país. Trata-se de uma invenção posterior dos republicanos para desmoralizar o passado monárquico do Brasil.

A realidade dos fatos foi completamente diversa...

No dia 3 de maio de 1823,a Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil iniciou sua legislatura com o intento de realizar a primeira constituição política do país. No mesmo dia, Pedro I discursou para os deputados reunidos, deixando clara a razão de ter afirmado durante sua coroação no final do ano anterior que a constituição deveria ser digna do Brasil e de si (frase esta que fora ideia de José Bonifácio e não do imperador):

"Como Imperador Constitucional, e mui especialmente como Defensor Perpétuo deste Império, disse ao povo no dia 1 de dezembro do ano próximo passado, em que fui coroado e sagrado – que com a minha espada defenderia a Pátria, Nação e a Constituição, se fosse digna do Brasil e de mim…, uma Constituição em que os três poderes sejam bem divididos… uma Constituição que, pondo barreiras inacessíveis ao despotismo quer real, aristocrático, quer democrático, afugente a anarquia e plante a árvore da liberdade a cuja sombra deve crescer a união, tranquilidade e independência deste Império, que será o assombro do mundo novo e velho.
Todas as Constituições, que à maneira de 1791 e 1792 têm estabelecido suas bases, e se têm querido organizar, a experiência nos tem mostrado que são totalmente teóricas e metafísicas, e por isso inexequíveis: assim o prova a França, a Espanha e, ultimamente, Portugal. Elas não tem feito, como deviam, a felicidade geral, mas sim, depois de uma licenciosa liberdade, vemos que em uns países já aparecem, e em outros ainda não tarda a aparecer, o despotismo em um, depois de ter sido exercido por muitos, sendo consequência necessária ficarem os povos reduzidos à triste situação de presenciarem e sofrerem todos os horrores da anarquia."

Pedro I lembrou aos deputados em seu discurso que a constituição deveria impedir eventuais abusos não somente por parte do monarca, mas também por parte da classe política e da própria população. Para tanto, seria necessário evitar implantar no país leis que na prática seriam desrespeitadas. A assembleia num primeiro momento se prontificou a aceitar o pedido do imperador, mas alguns deputados se sentiram incomodados com o discurso de Pedro I. Um deles, o deputado por Pernambuco Andrade de Lima, manifestou claramente seu descontentamento, alegando que a frase do monarca fora por demais ambígua. Os deputados que se encontravam na constituinte eram em sua grande maioria liberais moderados, reunindo "o que havia de melhor e de mais representativo no Brasil". Foram eleitos de maneira indireta e por voto censitário e não pertenciam a partidos, que ainda não existiam no país.

Havia, contudo, facções entre os deputados, sendo três discerníveis: 
  • os "bonifácios", que eram liderados por José Bonifácio e defendiam a existência de uma monarquia forte, mas constitucional e centralizada, para assim evitar a possibilidade de fragmentação do país, e pretendiam abolir o tráfico de escravos e a escravidão, realizar uma reforma agrária e de desenvolver economicamente o país livre de empréstimos estrangeiros. 
  • Os "portugueses absolutistas", que compreendiam não apenas lusitanos, mas também brasileiros e defendiam uma monarquia absoluta e centralizada, além da manutenção de seus privilégios econômicos e sociais.
  • E por último, os "liberais federalistas", que contavam em seus quadros com portugueses e brasileiros, e que pregavam uma monarquia meramente figurativa e descentralizada, se possível federal, em conjunto com a manutenção da escravidão, além de combaterem com veemência os projetos dos bonifácios.
Ideologicamente, o imperador se identificava com os bonifácios tanto em relação aos projetos sociais e econômicos, quanto em relação aos políticos, pois não tinha interesse nem em atuar como um monarca absoluto e muito menos em servir como "uma figura de papelão no governo".

O esboço da constituição de 1823 foi escrito por Antônio Carlos de Andrada, que sofreu forte influência das Cartas francesa e norueguesaEm seguida foi remetido a constituinte, onde os deputados iniciaram os trabalhos para a realização da carta. Existiam diversas diferenças entre o projeto de 1823 e a posterior Constituição de 1824. Na questão do federalismo, era centralizadora, pois dividia o país em comarcas, que são divisões meramente judiciais e não administrativas. As qualificações para eleitor eram muito mais restritivas que a Carta de 1824. Definia também que seriam considerados cidadãos brasileiros somente os homens livres no Brasil, e não os escravos que eventualmente viessem a serem libertados, diferentemente da Constituição de 1824.

Era prevista a separação dos três poderes, sendo o Executivo delegado ao imperador, mas a responsabilidade por seus atos recairia sobre os ministros de Estado. A constituinte optou também pela inclusão do veto suspensivo por parte do imperador (assim como a de 1824), que poderia inclusive vetar se assim o desejasse o próprio projeto de constituição. Entretanto, mudanças nos rumos políticos levaram os deputados a proporem tornar o monarca uma figura meramente simbólica, completamente subordinado à assembleia. Este fato, seguido pela aprovação de um projeto em 12 de junho de 1823 pelo qual as leis criadas pelo órgão dispensariam a sanção do imperador levou Pedro I a entrar em choque com a constituinte.

Por trás da disputa entre o imperador e a assembleia, havia uma outra, mais profunda e que foi a real causa da dissolução da constituinte. Desde o início dos trabalhos legislativos os liberais federalistas tinham como principal intuito derrubar o ministério presidido por José Bonifácio a qualquer custo e se vingar pelas perseguições que sofreram durante a Bonifácia ocorrida no ano anterior. Os portugueses absolutistas, por outro lado, viram seus interesses feridos quando José Bonifácio emitiu os decretos de 12 de novembro de 1822 e 11 de dezembro de 1822, onde no primeiro eliminava os privilégios dos lusitanos e no segundo sequestrava os bens, mercadorias e imóveis pertencentes aos mesmos que tivessem apoiado Portugal durante a independência brasileira. Apesar das diferenças, os portugueses e os liberais se aliaram com o objetivo de retirar do poder o inimigo comum. Os liberais e portugueses aliciaram os:

"[…]"desafetos dos Andradas, cujo valimento junto ao Imperador açulava muitas invejas e cuja altaneira, por vezes grosseira, suscetibilizava muitos melindres e feria muitas vaidades. Duros para com os adversários, os Andradas tinham suscitado fartura de inimigos no prestígio conquistado pela sua superioridade intelectual e pela sua honestidade. Os descontentes uniram-se para derrubá-los e na aliança se confundiram moderados com exaltados".

Dom Pedro I, alegoria do pós independência

VIVA DOM PEDRO I!!!

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