domingo, 13 de agosto de 2017

O que é o Voto Distrital Puro e porque ele é melhor que o Distritão


A comissão Especial da Reforma Política aprovou na noite de ontem um novo modelo para a eleição de deputados federais, o chamado “Distritão”. A aprovação vai totalmente na contramão dos interesses da população, que prega pela transparência no processo, pela redução nos custos de campanha, e também pela real representatividade do voto brasileiro. Esses anseios são atendidos pelo modelo Voto Distrital Puro, algo bem diferente do que foi aprovado pela comissão.

O que é o Distritão

Sistema utilizado no Afeganistão, Kuait, Emirados Árabes Unidos e Vanuatu, o Distritão é adotado somente em países sem tradição democrática. Bandeira do PMDB, o partido de sempre da política tradicional brasileira, o chamado Distritão foi defendido primeiro pelo ex-deputado Eduardo Cunha, e agora pelo presidente Michel Temer. Lembre-se disso.

No papel o distritão é simples. O eleitor vota no seu candidato de preferência como seu representante no estado e pronto. Em São Paulo temos 70 cadeiras para deputados federais, quando na verdade deveriam ser 120, mas isso é assunto para outra hora. Os candidatos com maior número de votos ocupam essas 70 cadeiras, preenchendo-as conforme a ordem de quem recebe mais votos. O distritão acaba com os problemas do coeficiente eleitoral e da coligação partidária, que permite a transferência votos de um candidato bem votado para os que não obtiveram votos suficientes, sendo ele do mesmo partido ou coligação. O distritão também simplifica ao determinar quem ganhou, pois não existe mais uma formula complexa para aferir quem recebeu os votos necessários. Por essas razões o distritão é melhor que o atual sistema proporcional, mas suas vantagens terminam por aí .

Na prática o modelo do distritão é péssimo, já que ele favorece apenas o parlamentar conhecido ou com acesso a fundo partidário. O poder legislativo é a porta de entrada para a classe média no sistema politico. Com o distritão cada deputado tem de fazer campanha como se fosse um candidato ao governo do estado, já que é preciso percorrer todo o estado por votos, e isso custa muito dinheiro. Se o candidato não tem dinheiro para gastar a sola do sapato, ele ou ela tem de ter verba para comprar exposição nas rádios e televisões locais, assim como para adquirir o apoio de prefeitos e vereadores. De forma objetiva, ele é um modelo que inviabiliza a entrada do povo na política.

Há também um agravante. Sim, fica pior. Com o distritão não poderemos implementar o mecanismo de revogação de mandato, conhecido como recall. Ele é essencial para a evolução de nosso sistema político, pois permite que o povo remova um candidato eleito caso perca a confiança nele. Funciona assim: faz-se um abaixo-assinado contra o mandato de um deputado e submete-se essa lista ao TSE. Se as assinaturas estiverem de acordo, o Tribunal Superior Eleitoral notifica o deputado que será realizada uma nova eleição para seu mandato, podendo o deputado optar por concorrer de novo ou renunciar ao cargo. Com o distritão o eleitorado de Campinas, por exemplo, não poderá remover um desses 70 deputados paulistas pois o deputado recebeu votos de todo o estado. Para que esse mecanismo possa funcionar é preciso o voto distrital puro. No final, o distritão acaba simplificando a fórmula do mais do mesmo que existe no Brasil, não havendo uma porta de entrada para novos candidatos ou de saída para os que mais desconfiamos.

O que é o Voto Distrital Puro?

O modelo que defendo para o Brasil, e que também é defendido pelo Movimento Liberal Acorda Brasil e diversos cientistas políticos do país, é o Voto Distrital Puro. Nesse sistema o Brasil é dividido em 513 distritos, sendo 70 deles no estado de São Paulo. O tamanho do distrito é determinado pelo número de eleitores ali registrados, com distritos abrangendo varias cidades e outros apenas alguns bairros. Tudo é proporcional ao número de eleitores. Este é o melhor sistema, pois é o único modelo que atende a três princípios essenciais ao mesmo tempo:

Transparência: é o modelo mais cristalino, pois é simples. É como se fosse uma eleição de governador, só que para um pequeno distrito. Quem atingir maioria simples ganha.
Custo: como a maioria dos distritos será pequena, o custo de campanha despenca. Em alguns casos o candidato poderá percorrer seu distrito a pé, facilitando a propaganda face a face com o eleitor. Fundo Partidário para que? A campanha vencedora será a da melhor porta a porta.

Representatividade: como o distrito é pequeno e o deputado precisa morar ali, a proximidade entre eleitor e eleito é a maior possível. Melhor de tudo, com o voto distrital o recall de mandato se torna possível. Não existe modelo que proporcione mais representatividade.

O sistema político brasileiro deve ser montado para privilegiar o Brasil e sua democracia, e não os políticos brasileiros. No voto distrital puro os partidos fazem uma prévia e determinam qual será seu candidato para cada distrito. O candidato escolhido é geralmente a liderança local. Isso acaba levando a militância de fato a se envolver na vida no distrito em busca da nomeação, o que oxigena nossa política e acaba com os candidatos que compram legenda. Neste modelo, o parlamentar eleito representa os interesses do distrito, fazendo com que o bairro inteiro saiba quem deve ser cobrado caso a região esteja abandonada ou precisando de algo. Acabam também os casos de políticos que se mudam para uma região onde é fácil ser eleito, e depois nunca mais voltam lá.


Há deficiências no modelo de voto distrital puro? Sim e não, pois algumas coisas dependem de outras variáveis como centralização de poder jurídico e de tributos. O funcionamento ideal do voto distrital puro requer a descentralização dessas duas coisas. Os deputados têm de ter mais responsabilidade jurídica e acesso a recursos locais, e o povo tem de ter mais poder para remoção caso eles não honrem essa responsabilidade. No sistema tributário e jurídico do Brasil de hoje as leis federais mandam em todo território, e os tributos arrecadados nos distritos estão todos nas mãos do presidente. É daí que surgiu o problema da compra de deputados com as “emendas parlamentares”. O sistema é tão perverso que o presidente compra apoio dos deputados com dinheiro que já era deles.  Mesmo se a descentralização jurídica e tributária não ocorrer, o voto distrital puro é muito melhor que o sistema atual ou o distritão, como podemos ver pelas razões anteriormente apresentadas.

E quanto ao voto distrital misto?

Esse modelo é tão complexo e caro quanto o atual sistema proporcional, e tão turvo quanto o voto em lista fechada. Por que? O que se chama de “misto” é na verdade uma lista fechada de candidatos indicados pelo partido. O eleitor vota no candidato de seu distrito e também vota numa sigla de partido. O problema começa aí, já que o candidato e o partido podem não ser vinculados. Além disso temos 513 assentos na Câmara dos Deputados, mas nem todas serão preenchidas por candidatos eleitos diretamente pelos distritos. Será necessário um número de cadeiras reservadas para os candidatos de listas de partidos. Quantas cadeiras serão dadas para cada? Decisão crucial.

Há também a questão do recall. Ele pode funcionar para o candidato eleito diretamente pelo distrito, mas e se o povo quiser fazer o recall de um deputado eleito pela lista fechada do partido? Não vai poder. O deputado eleito por lista tem maior proteção que o eleito pelo voto do povo? Outra questão crucial: para quem o eleitor de um distrito deve ligar para cobrar? O candidato eleito direto ou o da lista? Quem representa o distrito? Essa é mais uma das dúvidas geradas por esse sistema.

A lista de ambiguidades é infinita. O voto distrital misto acaba sendo apontado como ideal por não ser nem um nem outro, nem distritão e nem voto distrital puro. Na minha opinião ele é um sistema tão complexo que chega a ser impraticável, e só esses questionamentos acima já fazem com que ele não atenda nossas demandas por um sistema mais transparente, acessível e representativo.


Se eu tivesse que qualificar um sistema do melhor para o pior, classificaria assim:

  1. Distrital puro;
  2. Distrital misto;
  3. Distritão;
  4. Proporcional (modelo atual);
  5. Lista fechada.

Quem quiser um sistema representativo de democracia transparente, acessível e próximo do eleitor tem de exigir o distrital puro. Qualquer outro modelo não atenderá a essas qualificações.

LINK ORIGINAL - LP BRAGANÇA

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